Relatos de Experiências de Educação Ambiental
Regina Mascarenhas
Oi!
Me chamo Regina Mascarenhas. Sou pedagoga e moro em Belém/PA, pertinho da linha do equador. Atualmente trabalho no Planetário do Pará. E um dos meus maiores desejos era relacionar a EA com a Astronomia e gostaria de compartilhar com vocês algumas das minhas práticas realizadas. Por isso elaborei alguns relatos que contam melhor como foi essa experiência.
Espero que gostem e aproveitem.
Se quiser me escrever o endereço é: rgm@amazon.com.br
Abraços,
Regina
EDUCAÇÃO AMBIENTAL E ASTRONOMIA: PARALELOS E SIGNIFICADOS
Regina Mascarenhas - Pedagoga
A proposta de atuação como Técnica em Pedagogia nas atividades desenvolvidas no Planetário do Pará, vem sendo realizada a partir de uma atividade voltada a Educação Ambiental, onde se pretende verificar o olhar construído pelos estudantes que visitam o Planetário, para se chegar ao ensino ministrado nas escolas.
A partir de então, optei por uma atividade de relaxamento, acompanhado por uma música instrumental que proporcionasse essa sensação. Do momento em que as crianças eram organizadas, convidava-as para se deitarem sobre um tapete e fecharem os olhos, esquecerem os problemas que tinham e se concentrarem apenas no som da música. Era engraçado ver o comportamento delas, pois não possuem o hábito de realizarem “atividades escolares” relaxando e muito menos deitando.
Esta prática tem como objetivo:
· · Trabalhar o imaginário a partir de questionamentos gerados pela exploração prazerosa de sua realidade;
· · Verificar através da linguagem oral e pictórica como crianças e adolescentes compreende o conceito de Educação ambiental;
· · Provocar o diálogo sobre natureza e tecnologia;
· · Analisar, através dos desenhos, como a escola tem trabalhado os conceitos de Educação Ambiental em seu meio.
Essa atividade de relaxamento tem aproximadamente uns oito minutos de duração e foi, hora orientada por mim ou por uma das estagiárias destinadas a esse ambiente.
O
texto, que por mim foi escrito e narrado durante a atividade, pretende dar o
visitante uma visão de envolvimento (mente e corpo), permeado pelo temas de
religião, astronomia, natureza e cuidado ambiental..
O
texto elaborado é o seguinte:
“Feche
seus olhos e respire profundamente. Tente relaxar e ouvir apenas o som da
música.
Agora nós vamos sair desta sala, deste prédio, deste
bairro... vamos deixar que o nosso espírito voe bem longe. Ouça o som do vento,
da água, dos sinos que batem, na suavidade da flauta.
Agora, vamos imaginar que somos os primeiros habitantes do
Planeta Terra. Que somos um ser que está ligado a natureza, a água, a terra e
ao céu.
Imagine que você está vendo pela primeira vez um céu todo
estrelado. São milhões de estrelas! Mas... de onde elas teriam vindo? E como
elas teriam se formado? Alguém as colocou lá! Mas quem? Será que foi Deus?
Mas... de onde ele veio?
Vamos voar mais um pouco neste mundo inexplorado.
Imagine agora um lugar que tenha água e que esse lugar
fosse o seu favorito. Crie a imagem deste local em sua mente. Olhe com detalhe
para as cores das flores, das plantas, dos animais... você consegue sentir o
sol tocando a sua pele? Como será que esse lugar foi criado?
Imagine agora que você está nesse lugar que criou. O que
você faz lá? Você cuida dele? Você gostaria que maltrassem esse seu cantinho?
Será que o homem cuida do planeta Terra tão bem quanto você do seu lugar
favorito?
Agora nós vamos voltar para o Planetário bem devagar. Você
vai voltar para o bairro que estava... para o prédio... para esta sala.
Abra seus olhos devagar.”
Após a atividade, as crianças voltavam e falavam sobre o que haviam imaginado. Perguntei para eles o que haviam achado da atividade e a maioria respondeu que gostaram da sensação de “viajar” para o espaço. Em seguida, perguntei sobre a sensação de ver milhões de estrelas pela primeira vez. Uns disseram que ficaram maravilhados e que foi Deus que as criou. Alguns falaram de Vênus como a estrela mais brilhante do céu durante a noite. Outros disseram que as estrelas podem também podem ser deuses de outras culturas, como a do índio. Outros falaram que aprenderam sobre a existência delas por causa das naves espaciais controladas pelos astronautas. Perguntei então como eles sabiam da existência dessa tecnologia, se pedi para se imaginarem como os primeiros habitantes da Terra. Houve um silêncio. Um garoto respondeu: “Ora, tudo veio por que o homem olhou pro céu e foi pra lá”. Retruquei: “E como ele foi pra lá? Voando?” Ele me respondeu: ‘”Não de foguete!” Perguntei novamente: “E como se faz um foguete? Alguém sabe?” A partir daí eles começaram dizer que foguetes são construídos de aço, retirados da natureza pelo homem.
Neste momento, preferi parar nesta fala e dar continuidade a segunda parte da atividade onde eram criados os lugares favoritos de cada um. Muitos disseram que estavam em igarapés ou em uma praia linda e maravilhosa sem a poluição do homem, que estava nadando em um lugar com águas limpas e claras. Haviam pássaros e muitos bichos, com flores muito coloridas. Outros falaram que eram um lugar calmo e tranqüilo, sem barulho. Alguns estavam brincando de cabeça para baixo pendurados em árvores. Perguntei como eles gostariam que esse lugar fosse cuidado, e eles responderam: através da preservação.
“E a Terra? Como o Homem tem cuidado?” Perguntei. Eles disseram: Ele não cuida. Só faz destruir tudo! “Como assim”? “Ele destrói as árvores, polui os rios, mata os bichos...”
Pedi então que eles fizessem então o desenho desse lugar e que escrevessem sobre como eles gostariam que ele fosse cuidado.
Dentre
os vários trabalhos que recebi, pude perceber que a natureza passou a ser vista como algo
afetado, em geral de maneira desastrosa, pela sociedade humana que, por sua
vez, tornou-se a agressora do ambiente - sua vítima.
Em
muitas frases que li o Homem não é concebido como parte da natureza, ele está
fora dela. O que vigora no pensamento desse alunos é o Homem como predador e
explorador absoluto da Terra.
O que pude perceber com este trabalho experimental, é que a EA está sendo realizada dentro da escola, tem um caráter meramente informativo, está sendo realizada mais continuamente, muito embora venha consistindo na apresentação de alguns tópicos informativos em algum momento da disciplina de Ciências, mais freqüentemente quando são apresentados os conteúdos de Ecologia. e não propicia a verdadeira compreensão dos fenômenos estudados.
O programa curricular das escolas, é extensivo, levado a cabo de forma detalhista e, freqüentemente, exigindo do aluno processos contínuos de memorização. Os fenômenos abordados parecem não ter relações entre si e pouco é mostrado de sua inserção na vida do jovem estudante. Tudo isso faz com que o estudo seja algo muito pouco interessante para o aluno, assim como para o professor.
A EA deveria desenvolver hábitos, atitudes e comportamentos que propiciassem a formação, no alunado, de uma cultura eminentemente ativa na defesa de um meio ambiente saudável ou do uso dos recursos naturais não - renováveis.
Bem, sei que ainda tenho muitos passos a trilhar dentro desta nova área que abracei (EA). Por isso, considero um dos pontos importantes neste trabalho a sensibilidade de crianças como os adolescentes, que perceberam que todo o planeta Terra está conectado com tudo, com eles próprios, com a fauna e flora, com céu, ar, água, ....
Este foi um pequeno passo, para muitas ações que ainda irão gerar novas pesquisas e novos conhecimentos para os estudantes.
ESTAÇÕES
TEMBE
Regina
Mascarenhas - Pedagoga
Desde o mito às mais modernas concepções cosmológicas sobre o Universo, conceitos astronômicos e dados de observação têm sido conhecimento comum, embora modificado no tempo, para diferentes culturas na história da humanidade.
Ao apresentar o tema Os Tembé e as
Estações do Ano[1][1], o que se pretendia não era uma repetição de um
conteúdo escolar, que geralmente aborda esta temática dentro da visão das
regiões sul e sudeste do Brasil, distante da realidade da região norte do País.
A idéia era apresentar traços culturais de um povo que aplica a Astronomia em
sua vida e no seu cotidiano. Da mesma maneira que eles sentem as estações do
ano, nós aqui da cidade (Belém/PA) também sentimos as diferenças climáticas,
com o movimento da Terra, já que estamos localizados na mesma zona equatorial.
A partir do programa de cúpula[2][2] que as crianças haviam assistido, começamos o
trabalho, através da leitura de um pequeno verso de Osvald de Andrade chamado Erro
de Português, que mostra como os portugueses impuseram a sua cultura aos
índios.
Através de um diálogo, tomando como
pretexto o verso, os garotos perceberam que existem várias maneiras de ver o
mundo e não uma só. As civilizações da Terra construíram diferentes modos de
interpretar a vida, e da mesma maneira os Tembé o fizeram.
Exemplifiquei esta visão através das
estações do ano, que para eles, os índios, só existem duas: Kwarahy (estação
seca) e Aman (estação chuvosa). Os Tembé desenvolveram uma percepção própria
dos sistemas naturais que os rodeiam e um respeito por eles, passando esse
conhecimento e respeito de geração em geração.
Apresentar novas maneiras de vida,
provocou uma certa confusão na cabeça dos meninos. E surgiram vários
questionamentos como: o que significa Kwarahy? E Aman? Na estação da seca eles
passam fome?
Expliquei para eles, que a palavra
Kwarahy significa Sol, e a estação do Sol é a época que eles, os Cientistas
Mirins, gostam mais; pois tem festa junina, os meninos soltam papagaio no céu e
as escolas estão sem aulas. A associação da vida das crianças com a dos índios
foi imediata. E eles confirmaram que a partir dos meses de junho e julho o Sol
é mais forte não há tanta chuva em Belém.
Feito esse paralelo, perguntei para
eles o que entendiam por seca ou o que lembra a seca. Muitos responderam que é
a falta de água, a fome, o Nordeste.
É verdade que na época da seca, as
chuvas são mais escassas, mas essa é a época da colheita e da fartura na pesca para
os índios. Assim, tudo deve ser plantado justamente na época de Aman (chuva)
que é o período que começa as chuvas por volta do mês de dezembro. E colhido em
Kwarahy (Sol) no mês de junho. A vida na estação chuvosa fica mais difícil,
pois há menos alimento e muitos mosquitos.
A relação que os índios estabelecem com o meio ambiente está ligada
diretamente à questão da sobrevivência que se utiliza do seu próprio
conhecimento astronômico. Trata-se de uma relação que diz respeito de como
viver no mundo.
“Mas como eles sabem que
é a época certa da chuva ou da seca?”.
Utilizei, então, o globo terrestre para relembrá-los dos movimentos que a Terra
faz (rotação e translação), que tudo está em movimento. E que por meio da
observação do Sol e de algumas constelações, como a do Cruzeiro do Sul (Wirar
Kamy), é fácil saber a época certa.
Depois dessa conversa, passamos a uma
outra atividade que relacionava-se ao comportamento dos seres humanos em
diferentes épocas do ano. É claro que nossa referência agora, partirá do
período de Sol e chuva, pois quanto mais próximos da Linha do Equador, temos
menor definição das chamadas quatro estações do ano.
Não precisava nem perguntar: elas foram
logo dizendo que no “verão” sentem calor e muita sede, ficam mais agitados, que
empinam papagaios e dá vontade nadar em um igarapé. No “inverno” chove muito,
chegamos molhados na escola e só dá vontade de ficar em casa.
Pedi
que fizessem uma pesquisa em revistas sobre que roupas elas gostariam de usar
quando estivessem com calor, com vontade de brincar, quando estivesse chovendo.
Esse foi um momento de interação e troca de idéias entre as crianças, pois
observavam atentamente cada figura que iriam colar em seu diário de campo, já
que a roupa escolhida retrataria seu estado de espírito.
Para concluir este relato, acredito que
para essas crianças, a possibilidade de conhecer uma nova maneira de ver e
sentir o mundo foi especial. Pude com esta experiência ampliar meus os
horizontes de conhecimento e, para aqueles meninos, pude demonstrando que a
ciência não se encontra em lugares especializados ou distantes. Ela está mais
próxima do que podemos imaginar.
[3][1] Livro “O Céu dos Índios
Tembé”, Impressa Oficial do Estado – 1999.
[4][2] Programa documentário “O
Céu dos Índios Tembé” – Planetário do Pará – 1999.
Projeto
Apoema - Educação Ambiental