InformaLista

O Informativo da lista “Educação Ambiental”

No. 09 – 28 de janeiro de 2001

  Segunda Parte

Alguns textos apresentados na Lista de Discussão do Projeto Apoema - Educação Ambiental (Antigo Projeto Vida – Educação Ambiental)

Os textos não passaram por revisão ortográfica, portanto, podem haver erros.


"A Terra é um Ser Vivo" (Lutzemberger)

(Texto extraído de periódico)

"Há pouco tempo Gaia se olhou no espelho pela primeira vez. Células de seu cérebro a fotografaram da Lua. Ela se achou magnífica, azul, verde, diáfana."A frase é do ecólogo e engenheiro agrônomo José Lutzemberger e se refere à Terra. Para ele, Gaia, nome poético que a mitologia grega dava à deusa da Terra, é um ser vivo. Os seres humanos são células, algumas cancerosas, de seu tecido nervoso.

Lutzemberger, um dos pioneiros na defesa da Ecologia no Brasil, fundador da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (AGAPAN) nos anos 60, encara esta hipótese como um conceito. É com muita reverência que ele fala sobre ela. Segundo ele, o "conceito de Gaia", elaborado pela primeira vez pelo cientista britânico James Lovelock e pela cientista americana Lynn Margulis, deve seu nome ao escritor William Golding. Ele o propôs depois de os dois descobrirem que a ecosfera era um ser vivo.

"A ecosfera não é um simples sistema homeostático, automático, químico-mecânico. O planeta Terra é um ser vivo, um ente com identidade própria, o único de sua espécie que conhecemos. Se outras "gaias" existem no Universo, nessa ou em outras galáxias, serão todas coerentes. Um ser vivo tão destacado merece nome próprio" - justifica Lutzemberger, enquanto explica que esta visão é diametralmente oposta a até agora adotada pela ciência, que coloca os seres humanos como observadores externos da natureza.

Segundo ele, hoje é comum na visão científica a imagem da Terra como uma nave espacial. É uma figura na qual a Terra é apenas o palco da vida e, para nós, humanos, não passa de recursos aproveitáveis.

Mas a nave espacial engana. Uma nave tem passageiros. Em Gaia não há passa-geiros. Tudo é e todos somos Gaia.

O ecólogo gaúcho começa a explicar o conceito de Gaia pela interação. A re-lação profunda entre todos os elementos do planeta. Uma visão quase religiosa da Terra. Distante da doutrina cartesiana, reducionista, que durante séculos norteou o pensamento científico, ele convida para um "experimento mental" e pergunta:

-"Acaso seria possível um planeta como o nosso, mas no qual a vida estivesse constituída apenas por animais, sem que existissem plantas? É claro que não. Por que não? mesmo aqueles animais que só se alimentam de carne, como o leão ou o gavião caramujeiro, que carne comem? Eles comem carne de animais herbívoros ou de animais carnívoros que comeram herbívoros. A coisa sempre termina na planta. Por que termina na planta? Muito simples: a planta sabe fazer uma coisa que animal algum consegue fazer. Elas dominam a técnica da fotossíntese. Captam energia solar. Retiram do ar gás carbônico que combinam com água para fazer substâncias orgânicas. Neste trabalho elas liberam oxigênio. A reação da fotossíntese fornece duas coisas: carboidratos (açúcar, amido, etc.) e oxigênio.

Os animais, para todas as suas atividades, necessitam de energia. A única fonte de energia inesgotável na Terra é a radiação solar, enquanto durar o Sol, mais uns cinco bilhões de anos. Para captar a luz é preciso ficar parado, apresentar grande superfície de captação. É o que as plantas fazem com suas folhas. Pela sua natureza dinâmica, os animais não podem fazer isso. Servem-se das plantas, aproveitam as substâncias orgânicas produzidas por elas.

-Invertendo a pergunta inicial: poderíamos imaginar um planeta com vida sem animais, só com plantas? Impossível. O alimento principal das plantas é o gás carbônico, um elemento raro na atmosfera. Ele constitui apenas 0,003% de nosso envoltório gasoso. São os animais que não permitem que as plantas morram de fome. Eles dominam uma técnica inversa da fotossíntese, a respiração, pela qual retiram o oxigênio e colocam gás carbônico na atmosfera."

Para os que alegam que as plantas também respiram, Lutzemberger lembra que mesmo assim o balanço é positivo para o gás carbônico. Ele aponta um detalhe cu-rioso. O catalisador da fotossíntese é a clorofila, um pigmento verde. E o cata-lisador da respiração é a hemoglobina, também um pigmento, mas vermelho. Na teo-ria das cores, verde e vermelho são complementares.

-"Ora, planta e animais fazem parte da mesma unidade funcional. São órgãos de um organismo maior" - deduz, explicando que esta complementariedade e inter-dependência entre planta e animal, fotossíntese e respiração, sedentariedade e mobilidade, é apenas uma entre infinidades de interações que formam o grande processo vital.

-"Em alguns solos úmidos, extremamente ácidos e pobres em nutrientes, o mundo vegetal consegue avançar com pioneiras muito especializadas, certas plantas carnívoras. Não conseguindo retirar minerais do solo elas se alimentam de insetos. Quando morrem, com o húmus daí resultante enriquecem o solo, preparan-do-o para outras plantas menos especializadas. A morte é fundamental no grande contexto."

A eficiência na fotossíntese proíbe às plantas viajar. Mas elas também têm que conquistar território. O fruto saboroso é o preço que elas pagam ao animal que o come pelo transporte de sementes.

A vida, afirma o cientista, jamais poderá ser compreendida nos termos de Descartes, que via nos seres vivos, com exceção dos humanos, simples máquinas, relógios ou autômatos. Só uma visão sistêmica, unitária, sinfônica, poderá nos aproximar de uma compreensão do que é nosso maravilhoso planeta vivo. Atualmente, diz Lutzemberger, sobram biólogos mas está cada vez mais difícil encontrar na-turalistas. A diferença entre eles está na veneração. Para o naturalista, a na-tureza não é um simples objeto de estudo e manipulação. "Ela é algo divino, e nós humanos somos apenas parte dela."O naturalista procura a integração, a harmonia, a preserva-ção, o esmero, a contemplação estética.

ECOSFERA

Dentro da visão naturalista surgiu o conceito de ecosfera, que é o conjunto e a interação de todos os ecossistemas entre si e com o mundo mineral. A biosfera está intimamente integrada na litosfera, na hidrosfera e na atmosfera. O todo constitui uma unidade funcional, um organismo à parte, um sistema dinâmico inte-grado, equilibrado, auto-regulado.

A vida existe neste planeta há pelo menos 3,5 bilhões de anos e nele se mantém até hoje porque a Terra reúne condições muito especiais: tamanho e rotação certos à distância certa de uma estrela de tamanho certo. Daí o âmbito certo de temperaturas propícias aos processos bioquímicos.

Fundamental para a vida é também o confronto dos três estados físicos: só-lido, líqüido e gasoso. Para não se apagar, a vida ainda exige outras condições imprescindíveis: atmosfera de composição certa e em equilíbrio químico, salini-dade certa nos oceanos, âmbito certo de pH. Devem estar presentes pelo menos uns 25 dos mais de cem elementos da tabela de Mendeleyev (Tabela Periódica dos Elementos), explica o ecólogo.

Quando a NASA preparou as primeiras naves não tripuladas que desceram em Marte com aparelhos supersensíveis para ver se encontravam alguma espécie de vida, James Lovelock, que trabalhava como consultor de projetos, disse-lhes para não perderem tempo. Com uma análise da atmosfera de Marte ou de qualquer outro planeta poderia se dizer se havia ou não vida. Bastaria identificar com o auxílio de um espectroscópio se a atmosfera estava perto ou longe do equilíbrio químico. A atmosfera terrestre parece violentar as leis da química. Por uma razão e lógica próprias este desequilíbrio é mantido, assim como a temperatura. A Terra tem homeostase. Desde que apareceu a vida, há 3,5 bilhões de anos, o Sol já ficou duas vezes mais quente. Mas a vida na Terra, ou a lógica de Gaia, como quer Lutzemberg, manteve a temperatura própria para vivermos em sua superfície. Lovelock, pensando mais profundamente no problema, resolveu inverter o enfoque tradicional, segundo o qual a vida existe na Terra porque reúne e mantém condições certas. Se a Terra oferece condições, deduziu, é porque a vida assim as mantém. A primeira atmosfera terrestre foi de hidrogênio, mas foi perdida por causa da pequena gravidade do planeta. A segunda proporcionava forte efeito-estufa, pois o Sol era duas vezes mais frio. Ela era constituída basicamente de gás carbônico, metano e amoníaco, com restos de hidrogênio da primeira. Era reduzinte e de origem eruptiva. Somente nela poderia aparecer a vida. Se as primeiras substâncias orgânicas surgissem numa atmosfera como a nossa, seriam rapidamente destruídas pela oxidação.

A partir do metano e do amoníaco da atmosfera, com a energia das descargas elétricas e da radiação solar, formava-se sempre mais material orgânico nos oceanos. Com isso diminuía o efeito-estufa. O sol estava ficando lentamente mais quente. Era preciso controlar. Os primeiros organismos só podiam alimentar-se da matéria orgânica existente nos oceanos. A "sopa primordial" começou a autoconsu-mir-se. Havia perigo de extinção. Por volta de 2,5 bilhões de anos atrás Gaia achou a solução. A fotossíntese permitiu à vida sintetizar sua própria matéria orgânica captando energia solar. Era uma solução, mas apresentava perigo - foi a primeira grande crise de poluição. O oxigênio liberado na fotossíntese era vene-noso, mortal para os seres anaeróbios existentes. A vida superou aquela crise.

A atmosfera inverteu-se, de reduzinte passou a oxidante, tornando possível a vida animal. Mas as formas de vida anaeróbias sobrevivem até hoje no lodo dos banhados, na lama do fundo dos oceanos e nos intestinos dos animais superiores. São as bactérias metanogênicas. A poluição virou vantagem. Gaia superou sua pri-meira crise e continuou controlando o efeito estufa através de mecanismos de ho-meostase.

CÂNCER DE GAIA

No organismo de Gaia, nós, humanos, individualmente somos apenas células de um de seus tecidos. Um tecido que hoje apresenta-se canceroso, mas ainda tem cura, lembra Lutzemberger. Já somos os olhos de Gaia. Hoje atravessamos um momento decisivo na vida de Gaia, profetiza o ecólogo. O homem, conhecendo demais, cego de orgulho e com gula incontrolável, desencadeou um processo de demolição que supera as crises anteriores.

A sociedade industrial já está interferindo na concentração de gás carbônico na atmosfera, contrariando as tendências de Gaia em um de seus importantes sistemas de controle. Conseguimos aumentá-la de 0,025% antes da explosão indus-trial para 0,030% em menos de 200 anos. Uma variação de 20%.

Outro sistema de controle de temperatura encontrado por Gaia após a última glaciação está ameaçado. O sistema foi o alastramento das florestas tropicais úmidas no que hoje chamamos de Amazônia, Congo, Índia, Sri Lanka, Bangladesh, Indochina, Indonésia, Oceania, Austrália. Estas florestas têm uma fantástica evapo-transpiração. São gigantescos aparelhos de ar-condicionado que exercem in-fluência direta nos climas dos dois hemisférios porque estão na Linha do Equador.

Mais uma vez o homem está contrariando os desígnios de Gaia. Em todo o mundo estão sendo demolidas as florestas tropicais úmidas, num ritmo que alcança 100.000 km²/ano. No caso da Amazônia, se for devastada no Pará, o que parece certo logo após o ano 2000, poderá ser desencadeado um processo de colapso da grande floresta. Pois ela faz o seu próprio clima. Onde a floresta desaparece, adverte o ecólogo, é substituída por solo nu ou capoeira rala. No lugar da evapo-transpiração, o solo torrado pelo sol produz ventos ascencionais quentes. As nuvens se dissolvem, deixa de cair chuva mais adiante. Mas a Hiléia só sobrevive com chuvas copiosas.

-"Sobrarão recursos para Gaia? - indaga Lutzemberger - ou vamos incapacitá-la? Desde 1975 o clima anda meio caótico no mundo inteiro."

Ele relaciona ainda uma série de exemplos de auto-regulação de Gaia. A ma-nutenção da salinidade dos oceanos, cuja origem dos sais é a meteorização das rochas (por isso deveria ser cada vez mais salgados, mas a vida regula e mantêm constante a salinidade). Afirma ainda que a integração é mesmo anterior ao nas-cimento do sistema solar, que é um bilhão de anos anterior ao nascimento de Gaia, adverte.

-"Nesse momento, nosso comportamento canceroso representa um perigo mortal para Gaia. Mas isto não é inevitável. Se soubermos usar sabiamente o potencial intelectual que ela nos propiciou, assim como a fabulosa tecnologia que daí surgiu, poderemos até mesmo assumir o controle consciente de Gaia. Sistema nervoso ela já tem, seríamos a massa cinzenta de seu cérebro. A moderna eletrônica, com seus computadores sempre mais perspicazes, comunicação global instantânea por satélite, já começa a estruturar algo que quase poderia tornar-se meta-sistema nervoso planetário. Mas o conteúdo deste fluxo nervoso terá que mudar. se conseguirmos esquecer nossas querelas, acabar com a prostituição da Ciência para a demolição da vida e para os delírios da corrida armamentista e da "guerra nas estrelas", se conseguirmos colocar nosso gênio em ressonância com Gaia, só o futuro poderá dizer das alturas alcançáveis."

Com os olhos dos astronautas e nas imagens de satélites, Gaia, pela primeira vez, viu-se a si mesma em toda sua singela beleza, diz o cientista. Brancos véus espiralando, ora tapando, ora revelando o azul profundo dos oceanos, o amarelo dos desertos, as diferentes tonalidades de verde: ora confundindo-se com os pólos. Poucos, pouquíssimos, dão-se conta do monumental, não somente em termos de história humana, mas em termos de história da vida, que representa aquela primeira foto de Gaia, ou aquela outra de Meia Gaia subindo solitária no firmamento, negro como piche, da Lua.

Este é um fato totalmente novo! Um momento decisivo na vida de Gaia. Uma situação faustina. Se continuar a cacofonia atual, o desastre será total para nós. Talvez nem tanto para Gaia, profetiza Lutzemberger. Gaia tem muitos recursos, tem muito tempo. Com novas formas de vida encontrará saída. Sobram-lhe ainda uns cinco bilhões de anos até que o Sol, em sua penúltima fase evolutiva, ao tornar-se "gigante-vermelho", venha a expandir-se até aqui antes de apagar-se lentamente. Gaia será reciclada nos gases incandescentes do Sol, assim como cada um de nós seremos reciclados no solo.
 
 
 "Seria possível um planeta, como o nosso, cheio de vida mas sem plantas? Impossível. Seria possível um planeta só com plantas mas sem animais? Impossível. Os animais não permitem que elas morram de fome."
 
 "A atual crise de demolição supera as anteriores. No organismo da Terra, individualmente, somos células de um dos seus tecidos. E tecido que, hoje, infelizmente, se encontra canceroso."
 
 

José Lutzemberger.

http://www.hotlink.com.br/users/abinfo/GAIA.html


DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DAS PLANTAS

    A Declaração Universal dos Direitos das Plantas, concebida pelo professor universitário Adalberto Bello de Andrade é a seguinte:

Art. 1º - Todas as plantas nascem iguais perante a vida e têm os mesmos direitos à existência.

Art. 2º - O homem depende da plantas e não podem exterminá-la. Tem obrigação de colocar a seu serviço os conhecimentos que adquiriu.

Art. 3º - Toda planta tem direito à atenção, aos cuidados e à proteção do homem. Se a morte de uma planta for necessária, deve ser precedida de cuidados para o transplante da espécie.

Art. 4º - Toda planta pertencente a espécie selvagem tem direito a viver livre em seu próprio ambiente natural terrestre ou aquático e a reproduzir-se. Todo corte de planta, mesmo para fins educativos, é contrário a esse direito.

Art. 5º - Toda planta pertencente a uma espécie ambientada tradicionalmente na vizinhaça do homem tem direito a viver e crescer no ritmo e nas condições de vida e liberdade que forem próprias de sua espécie. Qualquer modificação deste ritmo ou destas condições, que for imposta pelo homem com fins mercantis, é contrária a esse direito.

Art. 6º - Toda planta escolhida pelo homem para companhia tem direito a uma duraçfão de vida correspondente à sua longevidade natural. Abandonar, esmagar ou queimar uma planta é ação cruel e degradante.

Art. 7º - Toda planta utilizada em ornamentação, principalmente em recinto fechado, tem direito à limitação razoável da permanência desse ornamentação, bem como à adubação reparadora, água pura e ar natural.

Art. 8º - A experimentação vegetal que envolver sofrimento físico ou dano irreparável à planta é incompatível como os seus direitos, quer se trate de experimentação médica, científica, comercial ou de qualquer outra modalidade. As técnicas de enxertia que visem à presevação da espécie devem ser utilizadas e desenvolvidas.

Art. 9º - Se uma planta for criada para alimentaçào, que o seja em solo previamente preparado, utilizando-se técnicas e elementos que permitam o seu crescimento natural, e que jamais alterem o sabor característico da espécie ou acelere a maturação dos frutos. Se uma planta for criada para transformação, seu corte deve ser precedido do replantio de, no míimo, 10 unidades da sua espécie.

Art. 10º - Nenhuma planta, fruto ou semente deve ser utilizada para divertimento do homem. As exibições de maneira imprópria ou chocante são incompatíveis com a dignidade da planta.

Art. 11º - Todo ato que implique a morte desnecessária de uma planta constitui biocídio, isto é, crime contra a vida.

Art. 12º - Todo ato que implique morte de grande número de plantas selvagens constitui genocídio, isto é, crime contra a espécie. A poluição destrói o ambiente natural e conduz ao genocídio.

Art. 13º - As cenas de violência contra plantas - cortes, derrubadas e queimadas - devem ser proibidas no cinema e na televisão, salvo se tiverem por finalidade evidenciar ofensa aos direitos das plantas.

Art. 14º - Os organismos de proteção e salvaguarda das plantas devem ter representaçào em nível governamental. Os direitos das plantas devem ser defendidos por lei, como os direitos humanos e os direitos dos animais.

http://www.geocities.com/HotSprings/Sauna/7303/madecl.htm


Ótimo site com downloads

http://www.bsi.com.br/unilivre/centro/downloads.htm


Cloração de água pode gerar resíduos cancerígenos 
29/05

   Pesquisa sugere que produtos de origem inorgânica devem ser trocados por equivalentes de origem orgânica

Campinas - A coleta e análise de mais de 200 amostras durante 6 meses, numa estação de tratamento de água de Juiz de Fora, em Minas Gerais, provou que a cloração pode gerar resíduos cancerígenos, quando feita com produtos de origem inorgânica. A pesquisa foi realizada por Jorge Antônio Barros de Macêdo, especialista em ciência e tecnologia de alimentos da Universidade Federal de Juiz de Fora, que também é diretor científico da ortofarma, empresa de controle de qualidade da água, incubada na universidade.

As amostras de água coletadas por ele, em 1997, durante a elaboração de sua tese de doutorado, continham trihalometanos ou THMs, resíduos considerados cancerígenos. "De acordo com a literatura norte americana, depois de consumir diariamente 2 litros água com THM, durante 40 anos, a probabilidade de se contrair câncer de bexiga é de 70%. Após 60 anos, é de 100%", adverte o pesquisador. Ele lançou um livro - Águas & Águas - neste início de novembro, sobre este e outros problemas relacionados à contaminação da água, na qual sugere a troca do produto usado nas estações de tratamento e nas indústrias, para eliminar os resíduos na água de consumo.

"Os THMs são resultantes da reação química de hipoclorito de sódio, usado na pré cloração, com ácidos húmicos e fúlvicos, derivados da decomposição de matéria orgânica, proveniente das margens ou do leito do curso d´água", explica Macêdo. Eles também foram encontrados em estações de tratamento de água de São Paulo, em uma pesquisa realizada pela Universidade de São Paulo, USP, igualmente referenciada no livro.

"Se trocarmos o hipoclorito de sódio (de origem inorgânica) por di-cloro-isocianurato de sódio (de origem orgânica) e o utilizarmos na fase pós cloração, eliminamos a contaminação por THMs".

Existem outras soluções com menos resíduos para o tratamento da água, como a luz ultravioleta e a ozonização, mas o custo é muito mais alto e a ação residual bem mais baixa. "A água tratada com a luz é boa na estação de tratamento, mas não há como garantir que o efeito perdure até a água chegar aos domicílios e a ozonização tem custos proibitivos", comenta.

O uso do di-cloro-isocianurato de sódio está previsto na portaria 150 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, editada em 1999. Mas a substituição dos sistemas de tratamento mais antigos - com o hipoclorito e os resíduos THM - não é obrigatória. 15/11

Liana John

Fonte: estadao.com.br

http://www.infolink.com.br/~ambienteonline/cloro.htm


O pesadelo chamado PET

Alfredo Sirkis (*)

Só uma minoria, infelizmente, dos municípios brasileiros tem seus aterros sanitários. E nas grandes cidade, como Rio e São Paulo, a concepção dominante a respeito do lixo ainda é de que esse problema só se resolve através de uma grande operação de transporte feita, diariamente, para os lixões. Os mesmos e tenebrosos lixões que, apesar já terem sofrido algumas reformas, ainda estão muito longe de ser um aterro sanitário dentro dos padrões técnicos ambientais, internacionalmente reconhecidos.

De 20 anos para cá, alguns setores da sociedade começaram a contestar e a suscitar discussões. Uma delas é a de que, no futuro, a questão do lixo vai se encaminhar para impasses extremamente graves. Por mais que o aterro sanitário seja considerado uma solução tecnicamente apropriada, ele tem um limite de espaço.

A perspectiva, nos próximos cinco anos, é de esgotamento desses aterros em quase todas as grandes cidades brasileiras, onde há um verdadeiro jogo de empurra sobre onde criar novos aterros. Em tese, todo mundo concorda que aterros sanitários têm de ser criados. Mas quando uma prefeitura ou órgão ambiental começa a definir novos locais para eles, as comunidades próximas começam a pular. Os ambientalistas locais se mobilizam. Todo mundo, enfim, quer que o aterro seja construído, sim, desde que seja implantado no jardim do outro e não no dele.

O que temos, então, de fazer, diante desse impasse? Diminuir a quantidade de lixo que a indústria e nós mesmos geramos em nossas vidas cotidianas, no trabalho, no lazer. Através de políticas industriais e comerciais, é possível reverter o monte de desperdício que se volta contra nós, na forma de lixões. doenças e problemas sociais. O que se desperdiça no Brasil, por exemplo, de embalagens desnecessárias é uma coisa impressionante.

O plástico que mata- Ultimamente, o que vem chamando a atenção é esta enxurrada impressionante das garrafas de pet no meio ambiente. Quando as empresa de bebidas passaram do vasilhame para a pet, elas quebraram um circuito quase perfeito de reaproveitamento.

Antigamente, você ia ao armazém, ao botequim, comprava uma coca-cola, tomava, depois devolvia o casco e pegava outro até receber o dinheiro do reembolso. Aí foi descoberta a pet, que começou a ser utilizada, permitindo um ganho de produtividade absolutamente fantástico para essas empresas. O valor da garrafa pet é 10 vezes menor do que o da de vidro, e ainda por cima diminui o custo do frete, por ser uma embalagem mais leve.

O que as empresas de bebida fizeram: apropriaram-se dessa idéia e transferiram o ônus do problema ambiental para o conjunto da sociedade.

Hoje, no Brasil, são produzidas 6 bilhões de garrafas de pet por ano. Isto é mais ou menos equivalente à população humana no planeta Terra.

E para onde isto tudo vai? Como só menos de 20% é reciclado, o resto vai tudo, criminosamente, para as águas pluviais, para as ruas, os bueiros, as valas, os canais, os lagos, os rios e, finalmente, para os mares, ainda provocando inundações por onde passam e encalham.

Na época que eu era secretário de Meio Ambiente no Rio de Janeiro, testemunhei uma tragédia terrível. Ela aconteceu na Barra da Tijuca, durante a enchente de 1996, quando milhares e milhares dessas garrafas ficaram entaladas debaixo de uma ponte e provocaram o represamento de um rio e a inundação de uma favela. O que aconteceu ali, por causa das pet? Morreram 13 pessoas. Entre elas, nove eram crianças. Por isso nós precisamos de uma legislação ambiental moderna que, em primeiro lugar, considere essas empresas, que se utilizam de garrafas pet e as colocam no mercado, legalmente responsáveis pelo seu destino final e ecologicamente correto. As embalagens pet têm de ser consideradas, perante a lei, exatamente como qualquer outro resíduo poluente que uma industria tem de saber descartar corretamente na natureza.

Se uma empresa siderúrgica não pode mais jogar sua poluição, seja atmosférica ou hídrica, no meio ambiente, por que não aplicar o mesmo rigor da lei em quem fabrica ou utiliza pet no Brasil? Mais. Essas empresas de bebidas, ou quaisquer outras que utilizam embalagens plásticas, teriam de fixar, de forma arbritária, um preço mínimo para cada garrafa pet e ser obrigadas a recomprá-las com esse valor.

Já existe, inclusive, um projeto de lei, que está nas mãos do deputado Fernando Gabeira para ser votado no Congresso Nacional, que coloca que o preço mínimo de recompra destas embalagens é em torno de 5% do valor da bebida em si. No caso de um refrigerante que custasse R$ 10, o valor de recompra da embalagem seria de R$ 0,50. O que se coloca de solução imediata para a sociedade é, pura e simplesmente, a idéia de diminuir a quantidade de lixo que ela produz.

* Ambientalista e Futuro de Secretário de Urbanismo do Município do Rio de Janeiro

Fonte: Estado de Minas

Extraído do site: http://www.infolink.com.br/~ambienteonline/em_questao.htm


AS ONGS E A EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO BRASIL


Cristina Alves de Carvalho
Consultora do Centro Europeu de Pesquisa e Treinamento em Educação Ambiental (ERTCEE-Bradford, Reino Unido) e da Sistemas e Soluções e Empresariais (Sempre)

As Organizações Não-Governamentais (ONGs) da área de meio ambiente têm desempenhado uma importante função no campo da educação ambiental no Brasil, assim como em países da Europa. Alguns autores apontam as ONGs como um potencial no desenvolvimento no país, e ainda não estabelecida no setor formal da educação (currículo), iniciativas no setor não formal tem ocorrido em diferentes partes do Brasil. A maioria destes trabalhos informais tem sido empreendidos por ONGs.

De acordo com o Censo (10/1993), o Brasil possui mais de 5 mil ONGs, o dobro do número que possuía a dois anos atrás. Deste total, 40% são chamadas "organizações ecológicas". Este grupo compõe-se desde entidades com ações puntuais --que são a maioria-- até aquelas com trabalhos em nível nacional. As ONGs podem ser divididas entre entidades conservacionistas, as últimas englobando sindicatos, grupos empresariais, instituições desenvolvimentistas e de defesa dos direitos humanos e das minorias.

As organizações conservacionistas se dedicam aos aspectos ligados à interrelação da espécie humana com seu ambiente natural, com a preocupação de conservar os recursos biológicos para estas e para as próximas gerações. Poderiam ainda ser subdivididas entre as ativistas e as técnicas, ambas importantes para o avanço das questões maiores. É necessário distinguir entidades que desempenham atividades concretas ligadas à conservação da biodiversidade e aquelas de cunho social ou desenvolvimentista que reconhecem em si mesmas uma missão conservacionista.

Muitas das ONGs iniciam suas atividades de educação ambiental com o objetivo de induzir um comportamento positivo com relação ao meio ambiente. Outras se envolvem neste campo, visando encorajar vítimas de problemas ambientais a tomar atitudes contra aqueles que causaram estes problemas. No entanto, pelo próprio processo da educação ambiental no Brasil, há uma tendência à execução de trabalhos isolados, sem interação e cooperação entre instituições (governamentais, empresas, universidades e ONGs), aumentando riscos de duplicação. Desta maneira, interessantes experiências de algumas instituições, que poderiam ser utilizadas por outras, são freqüentemente ignoradas.

O desenvolvimento de educação ambiental no Brasil iniciou-se em 1975, com a reformulação do currículo das escolas secundárias no contexto de ciências e físicas pela Fundação Educacional de Brasília. Este projeto beneficiou mais de 4.200 professores de escolas secundárias e contou com textos modulares e material didático. Seguindo-se a este, em 1977 foi criado o "projeto das Ciências de Meio Ambiente", introduzido nas escolas primárias de São Paulo. De 1978 à 1980, o Ministério da Educação desenvolveu o "projeto Ecologia para Escolas Secundárias" à nível nacional o qual não funcionou eficientemente devido a problemas de distribuição desigual de verbas entre os estados participantes.

Em 1983, como resultado da implementação do Plano Nacional de Conservação de Meio Ambiente, foi criada a Comissão Diretora para Planejamento para o Meio Ambiente, o qual representou o marco inicial para projetos de educação ambiental que incluíam a participação da comunidade. De 1985 à 1989, o Governo Federal criou o programa "Nossa Natureza", como resultado da pressão internacional contra o desmatamento da floresta amazônica. O objetivo do programa era o desenvolvimento de iniciativas de educação ambiental na Amazônia Legal (parte do ecossistema amazônico localizado no território brasileiro). O projeto foi encerrado em 1990.

Iniciativas de educação ambiental para a proteção de espécies de primatas e aves ameaçadas de extinção no Brasil, por exemplo, são idéias geradas no seio de ONGs conservacionistas de cunho técnico. São bons exemplos, os projetos de Educação Ambiental para a preservação de espécies ameaçadas de extinção como: arara-azul-de-Lear (Anodorhynchus leari), Canudos (Bahia), Fundação Biodiversitas (BH/MG-1990); "muriqui"(Bracteles arachnoides), Fundação Brasileira para Conservação da Natureza (FBCN-1973), hoje executado pela Fundação Biodiversitas; Sauim-de-coleira (Saguinus bicolor bicolor), Fundação Vitória Amazônica, Amazonas 1992, mico-leão-dourado (Leontopithecus rosália rosália), Associação Mico-Leão-Dourado, Poço das Antas (RJ-1983) entre outros.

Os projetos de educação ambiental para a proteção da arara-azul-de Lear e do mico-leão-dourado, por exemplo, desenvolvem atividades em nível formal e não-formal. No setor formal, estes dois projetos vem realizando cursos de treinamento para professores de 1o e 2o graus, beneficiando cerca de 150 rofessores locais. No setor não-formal, campanhas publicitárias, palestras, teatros de rua e repasse de tecnologias alternativas para líderes comunitários (ex: forno solar e clorador) também fazem parte deste escopo de atividades.

Sem minimizar os fatores sociais e econômicos que caracterizam as regiões destes projetos, principalmente na Bahia (sertão) é possível notar uma atitude positiva da comunidade com relação a estas espécies e ao ecossistema como um todo. A população remanescente de A. leari na natureza cresceu de 61 (7) para cerca de 104 indivíduos (comunicação pessoal: Ilmar B. Santos, Fundação Biodiversitas 1994). Isto se deve também ao fato da descoberta de um grupo de araras-azuis na região de Curaçá estimado 14 indivíduos. É bom ressaltar que ao lado das ações de educação ambiental, outros projetos tem sido também desenvolvidos, como estudos sobre a biologia destes animais; manejo de espécies importantes para sua alimentação (ex. licuri, no caso da arara-azul); maior fiscalização das áreas de ocorrência; e compra de terras para a implementação de reservas. É preciso salientar que alguns destes projetos estão ou tentam se entegrar e/ou cooperar com algumas instituições locais, regionais, nacionais e internacionais como exemplo, prefeitura, secretaria de educação, IBAMA, Fundação O Boticário, Conservação Internacional, Fundo Mundial para a Natureza (WWF) entre outras mesmo que de uma maneira informal.


ONGs e projetos urbanos de educação ambiental

Um bom exemplo de projeto urbano são as atividades desenvolvidas pelo grupo ecológico da cidade de São Paulo. O grupo tem levado crianças de escolas e, simultaneamente, apontando os principais problemas ambientais, por exemplo, congestionamento de tráfico; poluição do ar e depósito de lixo (1). Após a caminhada as crianças relatam oralmente o que viram e também descrevem o que mais lhes impressionou. Outro grupo, trabalhando na cidade de Salvador-BA promove educação ambiental mostrando a crianças e adultos a poluição da areia e do ar das praias da cidade nos meses de verão, motivando assim a participação das pessoas e reduzindo o número de poluidores.

A evolução da educação ambiental no Brasil é ainda tímida. A maioria das iniciativas positivas na área de meio ambiente num contexto isolado. Entretanto, projetos para a proteção de espécies ameaçadas por exemplo, tem demonstrado ser uma grande oportunidade para estimular a mudança de atitude, não somente com relação a preservação de uma única espécie, mas do ecossistema como um todo. A contribuição para comunidade local é significante, especialmente em locais de baixa renda onde se identifica a carência na área de alimentação, educação, saúde, etc. por outro lado, projetos urbanos que lidam com os principais problemas ambientais das cidades, se constituem no ponto de partida para uma discussão mais ampla sobre esta realidade visível e gritante.

Entretanto, há uma série de dificuldades que restringem o desenvolvimento destes projetos no Brasil, como a falta de suporte financeiro (incluindo logístico e técnico); de estrutura dos projetos (monitoramento e avaliação) e de integração e cooperação entre instituições. Embora, não haja dúvidas sobre a importante contribuição das ONGs no processo de evolução da educação ambiental no Brasil, é preciso salientar que a continuidade destes trabalhos tem sido altamente ameaçada por estes fatores. A limitação de recursos disponíveis p[ara educação conservacionista demanda um efetivo uso de avaliações para assegurar o sucesso dos projetos. Indubitavelmente, as ONGs, isoladas ou em grupo, jamais terão capacidade financeira e logística para substituir a ação governamental. No entanto, sem a sua contribuição, a educação ambiental no Brasil é preciso salientar que a continuidade destes trabalhos tem sido altamente ameaçada por estes fatores. A limitação de recursos disponível para educação conservacionista demanda um efetivo uso de avaliações para assegurar o sucesso dos projetos (8). Indubitavelmente, as ONGs isoladas ou em grupo, jamais terão capacidade financeira e logística para substituir a ação governamental (3). No entanto, sem a sua contribuição, a educação ambiental no país permaneceria inerte.

http://www.ecolatina.com.br/artigos/educamb/cristinalves.htm


A EDUCAÇÃO AMBIENTAL COMO PROPOSTA DE SUPERAÇÃO DA INSTRUMENTALIZAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO.

Prof. Msc. Laudemir Luiz Zart1.

luanzart@unemat-net.br

Unitermos:

Desenvolvimento, Sustentabilidade, Filosofia Relacional, Interdisci-plinariedade, economicismo, Etnocentrismo, Antropocentrismo.

A Educação Ambiental é um referencial teórico, metodológico e prático que tem como matriz o questionamento da instrumentalização da ciência moderna e a proposição de referenciais epistemológicas e éticos para a superação dos reducionismos e da fragmentação do conhecimento contemporâneo, propondo a inauguração de uma filosofia relacional que incorpore as multiplicidades e as complexidades das realidades naturais e dos constructos culturais. A perspectiva da Educação Ambiental é a construção da sustentabilidade social e biológica. Compreendemos por sustentabilidade social a garantia da sociodiversidade, que se caracteriza pela afirmação das multiplicidades e da pluralidades dos tipos de sociedades e das manifestações culturais. Adotamos a definição de sustentabilidade biológica as preocupações com a disponibilidade genética das diferentes espécies vegetais e animais encontradas nos variados ecossistemas. A proposição da sustentabilidade opõe-se ao etnocentrismo, ao antropocentrismo e ao economismo, metodologias reducionistas que não têm como fundamento a leitura e a compreensão das complexidades dos diversos ecossistemas naturais e construídos.

Desenvolveremos uma reflexão sobre referenciais teóricos no campo da Educação Ambiental, destacando questões epistemológicas e éticas, além de justificar a relevância da Educação Ambiental para grupos sociais e sociedades localizadas em contextos econômicos e culturais determinados. Indicaremos ainda possibilidades de métodos e técnicas que poderão ser aplicados na Educação Ambiental. Fundamentalmente fica a problematização da possibilidade de um ethos fundante das representações e das posturas que incorporem as complexidades no fazer e no conhecimento cotidiano-histórico. Ainda, a questão central, para a epistemologia e para a ética, é compreender a possibilidade de construção de um novo referencial de entendimento da ciência, da tecnologia e da relação homem-natureza.

Sob este aspecto, a técnica não é mais a principal preocupação da educação, ou pelo menos da Educação Ambiental, porque esta edifica um paradigma que se diferencia da razão iluminista que postulava que a ciência era a redentora da humanidade, ou que ela pudesse ser suporte para a superação dos problemas dos homens em todas as partes. Na verdade o que a razão moderna, ou a instrumental nos legou, foi uma contradição entre as condições reais de salvamento da vida através dos conhecimentos aplicados na medicina, por exemplo, e por outro a instrumentalização para a destruição global da vida na terra, onde o sintoma mais drástico é a bomba atômica. Tanto uma possibilidade como outra são resultantes da ciência. Em relação a estas possibilidades assim se expressa Duarte: "nunca o homem conheceu tão profundamente a natureza e nunca a utilizou tão universalmente, mas também nunca esteve tão próximo da destruição total da natureza e de si próprio, seja pela guerra, seja pela destruição ambiental." (Duarte: 1993, 16).

Neste sentido é que o paradigma da ciência é questionado, e ao invés de proclamá-la a redentora, deve ela ser colocada sob a austeridade da ética, isto é, deve ser problematizado o seu fundamento e ser verificado qual é a finalidade e quais são os valores inerentes na sua construção. Estas caraterísticas é que dão à Educação Ambiental um aspecto inovador. Releva-se a ética, ou o valor atribuído à natureza e ao homem, enfim à vida, em detrimento a instrumentalização de um conhecimento que sirva para a exploração indiscriminada dos recursos naturais e aos constructos culturais.

Uma das características da Educação Ambiental é a superação da estrutura disciplinar, que não proporciona a visualização das relações contidas na realidade existencial e representa a manifestação da instrumentalização da razão através da especialização e da racionalização entre meios e fins, voltando-se para a otimização da produtividade restrita dos meios e dos instrumentos de produção de bens materiais. Desta forma, o pensamento que é feito sob a estrutura curricular disciplinar é estático e fragmentário, causando ações discriminatórias de setores da realidade, tanto nas esferas públicas como nas privadas, quanto na análise e interpretação de fenômenos epistemológicos e do conhecimento.

Ao discutirmos o ambientalismo discorremos sobre um tema que não é unívoco. Na evolução da elucidação da temática ambiental percebem-se, através da literatura, colorações diversas, polissêmicas e contraditórias do enfoque ou das características atribuídas ao conceito de meio ambiente e da questão ambiental. No presente projeto entendemos por questão ambiental a forma "...como a sociedade se relaciona com a natureza - qualquer sociedade e qualquer natureza e isso inclui também as relações dos homens entre si." (Brügger:1994,55). Buscamos a compreensão da complexidade dos fenômenos sociais e ambientais para conceber a dinamicidade e a relacionalidade presentes nos excursos da história.

Desta forma podemos acompanhar a construção do tema ambiental, donde se verifica que as primeiras manifestações nesse campo estavam voltadas e ligadas ao ecologismo ou ao protecionismo, que dentre outras características apresentava um "reducionismo ecologista". Sob esta perspectiva a natureza simboliza a pureza, algo intocável. A filosofia ecologista pura tornava mais fácil a defesa incondicional de qualquer espécie vegetal e/ou animal do que pensar sobre as relações que se estabelecem na própria natureza e na história. É uma postura que eleva o homem para fora das relações, ou dito de outra forma, o homem não faz parte da natureza, mas é o seu algoz, por isso deve ser controlado e combatido.

A orientação ecologista teve a sua justificativa. Representou desde o princípio um combate a uma mentalidade localizada no pólo oposto. É o estilo de crescimento econômico que Sachs denominou de economismo, ou a forma de planejar e executar ações antrópicas que se reduzem ao campo econômico, ou, a desconsideração da dimensão ambiental na promoção do desenvolvimento, reduzindo esta acepção e atitude ao campo do crescimento econômico, isto é, a economia vista como crescimento do volume da produção de bens materiais, sem uma correlação com outras dimensões, como por exemplo a sócio-cultural. A este conjunto de debates e encaminhamentos Sachs propõe que "... queremos insistir nos perigos simétricos do economismo que não se preocupa em absoluto com a dimensão do ambiente e do ecologismo exagerado que entra em guerra com o antropocentrismo. No âmago da nossa problemática se encontra a interação dos processos naturais e sociais." (Sachs:1986a,44).

Este pensamento nos conduz para a superação dos pensamentos reducionistas: num pólo o economismo e no outro o ecologismo. O economismo conduz a exploração sem limites dos recursos naturais, ao lucro fácil e a curto prazo, desconsiderando as dimensões sócio-cultural e biofísicas. É o pensamento e a ação que tomou corpo com a própria modernidade, período que "...orientou-se no sentido de se tornar independente da natureza por meio da ciência." (Leis:1996,32). É a mentalidade que promoveu a revolução industrial, a mudança de postura e condução política do Estado e da Sociedade (revolução francesa). O economismo é a ação que capturou a ciência e a tecnologia e as colocaram a serviço da produção e ao processo de transformação da natureza, numa perspectiva de esta ser sem limites, situação denunciada e anunciada de forma sistemática pelo Clube de Roma, na década de 60. Com o ecologismo por sua vez ocorre a sublimação da natureza. Todas as ações e todos os movimentos se voltam para a intransigente defesa de tudo o que significa ser o natural, reafirmando as dicotomias existentes entre a natureza e o social.

Assim como o economismo, o ecologismo se reduz a um campo muito limitado. Enquanto os economicistas se programam para transformar tudo em mercadoria, em objetos de valor de troca, voltados à competitividade do mercado, os ecologistas puritanos e exagerados atuam no sentido restrito da preservação. Tudo e todos representam o perigo do fim da natureza, significando uma visão e uma postura escatológica frente a capacidade de avaliação e reencaminhamento da civilização.

Entre estas duas posturas extremas, surge uma possibilidade que engloba, como acima demonstramos ao citar Sachs, a interação entre a natureza e a sociedade. Acreditamos que esta via é a possível e a necessária. Representa, no entanto, a mais complexa, a que requer maior absorção de conhecimento e por isso uma mudança de mentalidade e da cultura do homem moderno, ou uma correção do "...eixo civilizatório da sociedade contemporânea" (Leis:1996,114). Portanto, deve representar a passagem de uma postura analítica unidimensional para as análises multi-dimensionais, relacionais e interdisciplinares, que "...objetiva superar a fragmentação do conhecimento" (Guimarães:1990,59), e ainda "...tomar ciência da complexidade dos problemas ambientais e da multiplicidade dos fatores que se explicam" (Id. Ib.,26).

Esta postura significa a complexificação dos modelos de planejamento, execução e avaliação das representações e das ações humanas. Requer que haja uma inserção e um cuidado com a conservação da diversidade biofísica e a sociodiversidade, somado ao crescimento da produção de bens materiais e imateriais. Neste sentido, o conceito de desenvolvimento terá como fundamento a absorção das possibilidades e necessidades de crescimento e por outro lado a manutenção das condições de vida, tanto para as gerações presentes (sincrônica) como para as gerações futuras (diacrônica). Nas palavras de Sachs "...a solidariedade diacrônica não pode, no entanto, separar-se do seu princípio gêmeo de solidariedade sincrônica com os nossos contemporâneos." E mais, "...os princípios gêmeos de solidariedade diacrônica e sincrônica não têm apenas um componente ecológico, mas também um componente cultural" (Sachs:1986 a,49).

Apresenta-se assim um desafio: compreender o meio ambiente, que exige uma interpretação globalizante, a construção da totalidade ou uma "...hipótese gaia, como modelo para a dinâmica planetária e celular" (Thompson:1990,12) e ainda, temos que nos capacitar para "...agir localmente e pensar globalmente" (Guimarães:1995,39). Exige-se a conceituação de meio ambiente sob os auspícios das multidimensões apresentado por Vieira como "...o conjunto de componentes físico-químicos e biológicos, associado a fatores socioculturais suscetíveis de afetar, direta ou indiretamente, a curto ou longo prazos, os seres vivos e as atividades humanas no âmbito globalizante da ecosfera" (Vieira: 1995,49).

Percebemos nas definições de Sachs e de Vieira elementos que provocam a nossa inteligência para imaginarmos o presente e o futuro, a diversidade biológica e cultural, a relação natureza-sociedade, o crescimento econômico e a conservação da natureza - campos interpostos que fundem a economia e a ecologia. Os elementos relacionados nos conduzem a mentalizar um novo sistema sociocultural, o qual é definido por Vieira como "...um conjunto de quatro elementos interdependentes e abertos ao meio ambiente. Estes elementos são denominados, respectivamente, subsistemas biológico, econômico, político e cultural" (Vieira:1995,51).

O quadro aqui apresentado nos deixa um desafio: como planejar e executar políticas de desenvolvimento que englobem tanto a dimensão do sistema natural quanto do sistema sociocultural? Para alcançar tal finalidade Sachs apresenta o conceito de ecodesenvolvimento que é "...um estilo de desenvolvimento que, em cada ecorregião, insiste nas soluções específicas de seus problemas particulares, levando em conta os dados ecológicos da mesma forma que os culturais, as necessidades imediatas como também aquelas a longo prazo" (Sachs:1986 a,18).

Para melhor colocarmos as idéias podemos destacar algumas características que consideramos fundamentais. O ecodesenvolvimento nos aponta para as especificidades de cada região, opondo-se assim ao que é denominado de mimetismo, ou a procura de soluções que imitam as políticas dos países mais evoluídos. Defende o desenvolvimento endógeno, isto é, o fazer a partir dos recursos próprios de cada ecorregião, considerando tantos os recursos humanos quanto os naturais. Esta orientação não significa que uma região determinada ao planejar as suas políticas, deva manter-se isolada. Deve buscar conhecimentos das experiências de outros povos, outras culturas, outras nações, porém sempre no sentido da solidariedade entre os povos, para a construção e edificação da liberdade e da igualdade. Requer esta postura a participação da coletividade, ou os conhecimentos e as experiências devem ser levados em consideração no planejamento de políticas públicas para o desenvolvimento de uma região. Esta condução "...preenche [...] antes de tudo, uma função pedagógica: força as pessoas a pensarem os futuros e depois a inventá-los" (Sachs:1986 a, 19).

Além das características acima citadas, Sachs propõe, em outra obra, cinco dimensões para o ecodesenvolvimento, ou seja: a) "Sustentabilidade social [...] o objetivo é construir uma civilização do ser , em que exista maior eqüidade na distribuição do ter e da renda, de modo a melhorar substancialmente os direitos e as condições de amplas massas da população e a reduzir a distância entre os padrões de vida abastados e não-abastados". b) "Sustentabilidade econômica [...] que deve ser avaliada mais em termos macrossociais do que apenas por meio de critérios de lucratividade microempresarial." c) "Sustentabilidade ecológica", que pode ser caracterizada como a "...intensificação do uso dos recursos potenciais dos vários ecossistemas - com mínimo de danos aos sistemas de sustentação da vida - para propósitos socialmente válidos." d) "Sustentabilidade espacial: voltada a uma configuração rural-urbana mais equilibrada e a uma melhor distribuição territorial dos assentamentos humanos e atividades econômicas." e) "Sustentabilidade cultural: em busca das raízes endógenas dos modelos de modernização e dos sistemas rurais integrados de produção, privilegiando processos de mudança no seio da continuidade cultural e traduzindo o conceito normativo de ecodesenvolvimento em uma pluralidade de soluções particulares, que respeitem as especificidades de cada ecossistema, de cada cultura e de cada local" (Sachs:1993, 24-27).

Temos indicadas assim características epistemológicas e societárias para alcançar atitudes que correspondam às argumentações do ecodesenvolvimento, ou do conceito de meio ambiente, entendido nas suas dimensões biofísicas e socioculturais. Para a construção de uma postura que rompa com o economismo e mesmo com o ecologismo, numa região determinada podemos afirmar que a mudança de mentalidade se dá através de um processo cultural-educacional, daí que a educação ambiental, associada às políticas públicas de planejamento têm como objetivo estar disseminando idéias, reflexões e práticas que questionam o atual status quo e auxilie na construção de uma nova ética e na "...criação gradual de projetos-piloto dotados de efeito demonstrativo" (Vieira:1995,63).

Para concretizar tal finalidade, há que se ter em vista um projeto que leve em consideração estratégias pró-ativas (que antecipam o futuro) e inovadoras de desenvolvimento baseadas nos princípios de "equidade social, prudência ecológica e eficiência econômica" (Strong. In: Sachs:1993,7). Podemos nos questionar, será esta uma nova utopia? Conseguiremos ultrapassar a era da competitividade e ego-individualista e inaugurar a "era da solidariedade"? (Thompson:1990,31). Seremos capazes de superar a visão antropocentrista que orienta as nossas práticas e implementar uma "...ética biocêntrica que inclui os animais, as plantas, as pedras, os ecossistemas, o planeta e o próprio universo"? (Leis:1996,31).

As questões aqui colocadas são desafiadoras. No entanto, apesar de estarmos dando a característica para a Educação Ambiental como superadora dos modelos reducionistas, Brügger questiona a forma como a esta está sendo desenvolvida nas escolas, ou em programas educacionais implantados. Diferencia duas questões básicas. Primeiro considera que a educação que não é crítica e que não questiona o atual status de exploração do homem e da natureza, é uma forma de treinamento, torna-se no conteúdo e na metodologia um adestramento ambiental, isto é, "...um tipo de instrução onde as pessoas são levadas a executar determinadas funções e tarefas, identificadas com um determinado padrão utilitarista-unidimensional de pensamento-ação", e continua citando Marcuse "...as aspirações e os objetivos que por seu conteúdo transcendem o universo estabelecido da palavra e da ação são repelidos ou reduzidos a termos desse universo" (Brügger:1994,79).

Considera, ainda Brügger, que a educação é um ato político e que para ser identificada como um ato educativo na perspectiva ambiental necessita mais de "...uma mudança qualitativa de conteúdos" do que de "informações eficientes" - o que só será possível com uma maior "ênfase nos aspectos éticos e políticos da questão ambiental" (Id. Ib., 85). A nova ética deve ser capaz de desconstruir o ethos "...comportamental da sociedade industrial", a razão instrumental e implantar e "...socializar o ethos de uma sociedade ambiental." (Op. Cit., 89).

Para promover o campo epistemológico da Educação Ambiental, a ONU promoveu eventos para a discussão de temas relevantes na contemporaneidade da humanidade. Temáticas que são comuns ao conjunto dos homens. Destacamos dois eventos que dão especial atenção à EA.

A Conferência de Belgrado realizada em 1975, levou em consideração a construção de um ambiente sadio, que tornasse possível a implementação de condições reais para o aumento da qualidade de vida. "Seu tema principal foi a premente necessidade de uma nova ética global que proporcionasse a erradicação da pobreza, da fome, do analfabetismo, da poluição e dominação e exploração humanas" (Dias:1994,58).

O segundo evento de relevância ocorreu em 1977 em Tbilisi na Geórgia, na "Primeira Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental". Este encontro tornou-se um referencial para o desenvolvimento de programas de Educação Ambiental. Por sua importância, transcrevemos alguns princípios que orientam o perfil de educação que envolvam a questão ambiental:

"Levar em conta a totalidade do ambiente, ou seja, considerar os aspectos naturais e construídos pelo homem, tecnológicos e sociais, econômicos, políticos, histórico-culturais, morais, estéticos;

Ser um processo contínuo e permanente, iniciando em nível pré-escolar e estendendo-se por todas as etapas de educação formal ou informal;

Adotar perspectiva interdisciplinar, utilizando o conteúdo específico de cada matéria de modo a analisar os problemas ambientais através de uma ótica global e equilibrada;

Examinar as principais questões relativas ao ambiente tanto do ponto de vista local como nacional, regional e internacional, para que os educandos tomem conhecimento das condições ambientais de outras regiões;

Concentrar-se nas condições atuais e futuras do ambiente levando em conta a perspectiva histórica;

Insistir na necessidade e na importância da cooperação em níveis local, nacional e internacional para prevenir e resolver os problemas do ambiente;

Estudar, de modo sistemático do ponto de vista ambiental, os planos de desenvolvimento e crescimento;

Fazer com que os alunos participem da organização de suas próprias experiências de aprendizagem e tenham a oportunidade de tomar decisões e de aceitar as consequências;

Inter-relacionar os processos de sensibilização, aquisição de conhecimentos, habilidades para resolver problemas e especificações dos valores relativos ao ambiente em todas as idades, enfatizando sobretudo a sensibilidade dos alunos mais jovens em relação ao meio ambiente de sua própria comunidade;

Ajudar os alunos a descobrirem os sintomas e as causas verdadeiras dos problemas do ambiente;

Ressaltar a complexidade dos problemas ambientais e, em consequência, a necessidade de desenvolver o sentido crítico e as aptidões necessárias à sua resolução;

Utilizar diversos meios educativos e uma ampla gama de métodos para transmitir e receber conhecimentos sobre o ambiente, enfatizando de modo adequado as atividades práticas e as experiências pessoais" (Guimarães:1995,20-21). (Grifos nossos).

Assim, a metodologia, a epistemologia e o modelo de análise das realidades e das práticas sociais da Educação Ambiental, terão que ser necessariamente relacionais, isto é, interdimensionar os fatores socioculturais e naturais, para atingir a totalidade e a complexidade da realidade do meio ambiente, a fim de incorporar os princípios de participação política, cooperação entre gerações, manutenção da diversidade cultural e biológica, a solidariedade sincrônica e diacrônica, a sustentabilidade do desenvolvimento, a multidimensionalidade e a interdisciplinariedade.

Desta forma podemos compreender a relevância da Educação Ambiental enquanto filosofia para a desconstrução do modelo predador inaugurado pelo homem moderno. O pensamento do homem moderno volta-se para instalar a eficácia da exploração dos recursos naturais, transformando-os em bens de consumo - ou em mercadorias. Esta concepção levou o homem a ter uma atitude irrestrita perante a natureza, considerando que esta fosse ilimitada e que jamais a humanidade teria problemas como os ecológicos - evidenciados a partir dos anos 60.

Esta postura evidencia uma questão ética - está embutida de valores que estão relacionados tanto ao próprio homo faber e ao homo sapiens, quanto ao conjunto da natureza. A modernidade , período e pensamento, que inaugura as ciências experimentais, é encarregada de construir uma postura científica que fosse capaz de absorver os conhecimentos prático-empíricos, isto é, os direcionados para a descoberta das leis da natureza, pressuposto para a promoção do progresso.

Mostra-nos a história que esta postura tornou-se eficiente e instalou-se, ou tornou-se hegemônica a partir de práticas como o mercantilismo, o industrialismo, o liberalismo econômico e político inaugurados na Europa já a partir do século XII, ou mesmo antes, data que não pode ser delimitada com rigor, como faz a historiografia descritiva e linear, visto que a contradição de uma época histórica está necessariamente na época anterior com a qual mantém relação de superação. Assim como o modelo que gesta a superação do modelo de desenvolvimento atual constitui-se a partir das contradições existentes.

A modernidade inaugurou dois sistemas econômicos e políticos que até os anos 80 opunham-se e alimentavam os ânimos de militantes, de governos, de organizações. Sob a égide do capitalismo e do socialismo a humanidade se dividiu em dois blocos que tinham a enorme capacidade de semear o medo e o terror da possibilidade de uma guerra global. Constituíam blocos que representavam formas ideológicas diferenciadas de interpretar o homem, a natureza, o trabalho, a história, o poder, a liberdade, etc. Supostamente o socialismo representou uma forma de organização superior - mais evoluído, melhor estruturado , mais humano, menos explorador (ou não-explorador), menos dominador (ou não-dominador). Constituía a referência para homens e mulheres que lutavam por um mundo mais justo e mais humano. Foi em nome do socialismo (ou do comunismo), que muitos homens e mulheres foram perseguidos, torturados, exilados e até mortos pelos regimes autoritários e ditatoriais praticados por regimes militares e de exceção.

Com a queda do muro de Berlim em 1989, todos os que sonhavam (e talvez ainda sonham) com um mundo melhor ficaram estarrecidos com as não-verdades que o sistema do leste representava. Situação aliás já denunciada anteriormente, porém por muitos ignorada. Verificou-se que o sistema socialista não significou de fato um sistema alter ao capitalismo, pois as caraterísticas daquele, ou seja, a exploração indiscriminada da natureza a submissão do homem a trabalhos forçados (expurgos de Moscou, o desterro da Sibéria, a coletivização forçada das terras que levou a morte 30 milhões de camponeses, além da burocratização do Estado e da dogmatização-sectarização do partido).

Estas revelações pareciam o fim da história, o fim do marxismo, o fim do sonho de uma sociedade que ultrapasse as estruturas de classe e o "crescimento pela desigualdade" (Sachs: 1993,19) característicos do capitalismo. Frente a este quadro, autores para salvaguardar o pensamento marxiano das deturpações inauguradas na União Soviética, denominam aquele sistema de "Socialismo Real", visto que instrumentalizou o Estado e a Sociedade e as relações de trabalho e de poder para a concretização de uma objetividade produtivista, ou seja, "... para o sistema produtor de mercadorias." (Kurz:1993,45).

Podemos ainda ter sonhos e desafios? A partir da frustração do "socialismo", muitos militantes voltaram-se para a defesa da natureza, numa postura extrema que fora interpretada posteriormente de ecologismo, visto a sua intransigência com o próprio homem, pondo-se na defesa restrita de espécies em extinção, como já vimos acima. Este pensamento prenunciou "...desastres ecológicos e previsões apocalípticas" (Brügger:1994,17) as quais fazem parte dos anúncios dos noticiários da imprensa, de programas de partidos políticos e das ações de organizações não-governamentais.

É lógico que este pensamento e este movimento tem uma razão, visto que se opõe ao economismo, ou seja a fórmula econômica que requer o lucro imediato, não se importando com os impactos causados nos ecossistemas e nos homens. O economismo, é ação econômica que registra a sua eficácia em tabelas com as curvas representando a evolução da produção, não importando a poluição do ar, dos rios, enfim a destruição da natureza ou das diversidades culturais. A eficiência econômica apresentada em estatísticas é o objetivo final. Esta fórmula se apresenta tanto no capitalismo ocidental quanto no socialismo real: "o lucro o último e único objetivo da humanidade" (Kurz:1993,33).

Então qual poderá ser a alternativa? Sachs ao apresentar o conceito de Ecodesenvolvimento, ou de desenvolvimento sustentável, constrói um pensamento que trata da homeostase entre o desenvolvimento econômico - transformação da natureza em bens de consumo e a sua conservação, além das práticas participativas, cooperativas e solidárias. Inaugura-se um pensamento e um conhecimento que possibilitam a superação da instrumentalização inerente no modelo desenvolvimentista capitalístico.

Para alcançar tal finalidade devem ocorrer mudanças de postura ética do homem frente a natureza e o próprio homem. Como alcançar este objetivo? Fundamentalmente representa uma questão cultural, portanto de educação. Neste sentido podemos afirmar que a humanidade deve se reeducar, ou seja, compreender a natureza e compreender-se natureza, isto é, fazer-se na sua própria natureza para conservá-la e poder tirar dela a fonte de vida. Queremos destacar que não compreendemos a educação somente em seus aspectos institucionais (escolarizada), porém em seus aspectos mais amplos de visão de mundo que direcionam as práticas e as disposições dos indivíduos e dos grupos sociais nas múltiplas atividades.

Sob a orientação deste pensamento podemos implementar um projeto e posteriormente um programa de Educação Ambiental em localidades determinadas, influenciando na construção de um pensamento que esteja embasado para questionar a exploração indiscriminada dos recursos naturais, transmudando para uma postura que tenha condições de absorvê-los numa perspectiva de racionalidade que procure construir uma relação de equilíbrio entre a prática antrópica e os efeitos que esta causa sobre o meio no qual ocorre a ação.

Para consecução de objetivos embasados na sustentabilidade, faz-se mister que o homem conheça melhor a si próprio e a natureza, que tenha uma visão ampla da complexidade dos ecossistemas e sobre as relações que neles ocorrem. Todo homem e toda mulher devem compreender que os recursos naturais são limitados, que no presente devemos pensar nas gerações futuras, que o uso indiscriminado dos recursos naturais simboliza a autodestruição, que a poluição não é sinal de progresso e de trabalho, mas de inoperância, de mal planejamento e que estas influenciam na saúde dos indivíduos e na saúde pública. Portanto é necessário um pensar e um agir relacional.

Pensar e aplicar a Educação Ambiental tem relevância social porque pensa e questiona a prática de uma sociedade colonizada pelo pensamento unidimensional e economicista, que está sob muitos aspectos influenciada pela ideologia do capital rápido e fácil, tão disseminada pelos mentores do processo capitalístico moderno. A Educação Ambiental poderá criar um contra pensamento, óbvio sob todas as resistências dos grupos sociais que se beneficiam da exploração sem limites dos recursos naturais e da força de trabalho humano.

No campo das ciências, faz-se possível e necessário colaborar na evolução do pensamento da Educação Ambiental, visto que as experiências e as reflexões nesta área estão muito limitadas, principalmente quando se refere a construção de uma forma mais ampla que englobe a postura cultural da população, não se restringindo ao campo da ecologia e da biologia, ou, na pura compreensão da funcionalidade das relações que ocorrem nos ecossistemas sem relacioná-los com a sociedade.

Acreditamos que o desafio maior está na possibilidade de se fazer uma educação diferenciada, não somente enquanto técnica de ensino-aprendizagem mas principalmente dos conteúdos e as relações que os conhecimentos das diversas ciências (disciplinas) mantém entre si, portanto, uma perspectiva trans e interdisciplinar. Falamos em possibilidade, enquanto imaginação, ou seja, a "... capacidade de sentir aquilo que você ainda não conhece, de intuir o que não pode ser compreendido, de ser mais do que é possível conhecer" (Thompson:1990,8). Tentar compreender o que não pode ser, atualizar o futuro, e potencializar o presente, dinamizando as mentes curiosas e criativas, para arquitetar uma ética que valorize a vida e o ser. Esta é a possibilidade e a imaginação que através do presente projeto tentaremos construir. Ao falarmos em construir, nos referimos a um processo, a algo que poderá se tornar um fenômeno concreto depois de muitos tempos futuros terem se tornado tempos presentes e tempos passados.

Um desafio metodológico fundamental para a Educação Ambiental é compreender como se constrói o pensamento ou o saber numa região determinada e em circunstâncias definidas. Desta forma podemos questionar, como as pessoas representam o "meio ambiente", numa região de colonização recente e que tem sua base econômica baseada na exploração extrativista da natureza, como ocorre em Sinop – Mato Grosso – considerando que este é o locus empírico de investigação. Neste sentido podemos instigar uma problemática, como construir um programa de Educação Ambiental que atenda orientações epistemológicas interdisciplinares e multi-dimensionais, além de incorporar princípios éticos que valorizam o homem e a natureza, compreendendo as partes pertencentes a uma totalidade ou a um ecossistema?

Para responder de forma preliminar a esta questão, buscaremos elementos teóricos e metodológicos na Sociologia do Conhecimento fundada por Mannheim, construindo um paralelo entre esta e a epistemologia. O objeto da Sociologia do Conhecimento ou, e da Epistemologia é a compreensão do processo da construção do pensamento, ou a elaboração do discurso sobre a origem e a evolução do saber. O que Mannheim contrapõe na Sociologia do Conhecimento à Epistemologia é a forma como se produz o pensamento. Enquanto a epistemologia, como teoria do conhecimento, permanece no campo da lógica, ou na noologia, isto é, na compreensão dos fenômenos, como tendo uma origem pura na mente, a Sociologia do Conhecimento busca compreender a lógica do pensamento em bases concretas, ou, nas circunstâncias que envolvem as particularidades numa situação determinada. Assim, "a Sociologia do Conhecimento busca compreender o pensamento no contexto concreto de uma situação histórico-social, de onde só muito gradativamente emerge o pensamento individualmente diferenciado." (Mannheim:1986,31). Assim, o conhecimento se produz num "...contexto significativo." (Id. Ib.,49). Podemos afirmar ainda com Mannheim, "...que existem modos de pensamento que não podem ser compreendidos adequadamente enquanto se mantiverem obscuras suas origens sociais." (30).

Desta forma, as representações, as imaginações e os pensamentos não se dão no campo da noologia, mas se fazem através da ação concreta cotidiana dos indivíduos sob condições determinadas. Portanto, a perspectiva, ou "...o modo global de o sujeito conceber as coisas" (Op. Cit. ,288), se dá em um contexto histórico, social e sob circunstâncias determinadas.

Como, no entanto, compreender as circunstâncias? Heller, ao analisar o cotidiano e a história nos diz que as "...circunstâncias determinadas, nas quais os homens formulam finalidades, são as relações e situações sócio-humanas mediatizadas pelas coisas. Não se deve jamais entender a circunstância como totalidade de objetos mortos, nem mesmo de meios de produção; a circunstância é a unidade das forças produtivas, estrutura social e formas de pensamentos..." (Heller:1970,01).

Falta-nos dizer que as circunstâncias estão envoltas numa cotidianidade, que elas estão num tempo do fazer-se. Porém, ao falarmos em cotidianidade, abordamos uma nova problemática. É preciso compreender o que se entende por cotidiano e como ele se constrói. Podemos afirmar que "a vida cotidiana é a vida de todo homem [...] é a vida do homem inteiro." Além de se apresentar "heterogênea" e "hierárquica" (Heller:1970,18-19). Assim temos condições e situações que se fazem no cotidiano, portanto, impregnado de significados, de valorações, de circunstâncias relacionais, múltiplas, contraditórias e diversas. Mas o cotidiano não é por si, não é isolamento, é história. "A vida cotidiana não está ‘fora’ da história, mas no ‘centro’ do acontecer histórico: é a verdadeira ‘essência’ da substância social." E mais "as grandes ações não cotidianas que são contadas nos livros de história partem da vida cotidiana e a ela retornam." (Id. Ib. ,20).

Mas como relacionar a vida cotidiana do indivíduo com a história? Heller nos propõe que "o indivíduo é sempre, simultaneamente, ser particular e ser genérico." (Op. Cit. ,20). Portanto, o que o indivíduo é e faz no cotidiano da sua vida é resultante do processo histórico, isto é, o ser particular do indivíduo é a estrutura que se manifesta nas ações e nos pensamentos, que se dialetizam no cotidiano. Mas a estrutura do indivíduo manifesta no cotidiano, está "estruturada", como também é "estruturante" (Bourdieu:1996,43), isto é, que é construída na história e que intervém no processo histórico-social. Assim, para compreender o ser particular do indivíduo faz-se mister buscar a explicação das suas características manifestas e latentes, portanto culturais, na história e na generalização do ser. "...É o homem um ser genérico, já que é produto e expressão de suas relações sociais, herdeiro e preservador do desenvolvimento humano; mas o representante do humano-genérico não é jamais um homem sozinho, mas sempre a integração," e a suprema integração é a "humanidade." (Heller:1970,21).

Assim todo ser, particular e genérico, "...é a síntese de múltiplas determinações, produto de condições sociais e culturais." (Libâneo:1990,143). É um ser concreto, que se apresenta no cenário da história, que deve ser pensado: "o concreto-pensado é o desvendamento do concreto-real." (Id. Ib. ,145). Portanto, para pensarmos o concreto real cotidiano necessitamos buscar na história o seu fundamento, já que o cotidiano é resultante e está impregnado da história.

Esta proposta de ação requer pesquisa. "Pesquisar [...] é sobretudo aprender em sentido criativo [é despertar] a curiosidade, é um diálogo inteligente com a realidade, é a capacidade de questionamento, [é estabelecer] posturas dialéticas. [É enfim interpretar a realidade, pois] a realidade nunca é evidente, interpretar é preciso." (Demo:1996).

Queremos defender que o cientista não deve procurar somente saber, estudar, analisar, mas questionar, comprometer-se, intervir e mudar a realidade. Então podemos, no desenvolvimento de um projeto de pesquisa estar propondo ações de intervenção na realidade de uma sociedade determinada. Esta é a proposição da pesquisa-ação, metodologia que exige todo rigor conceitual, o que é próprio da ciência, mas que acrescenta a possibilidade da construção do conhecimento no nível da ação, portanto, empenhada num processo histórico. A pesquisa-ação, é a "...linha de pesquisa associada a diversas formas de ação coletiva que é orientada em função da resolução de problemas ou de objetivos de transformação." (Thiollent:1992,7).

Para isso ela terá que ser dialógica, inserida, problematizadora, possuir radicalidade e historicidade. Ser uma "leitura relacional, mas também geradora" (Bourdieu:1996,27), por isso necessariamente dinâmica. A inserção deve ser crítica, "...que só existe na dialeticidade objetividade-subjetividade." (Freire:1983,41). Ela deve ser práxis, isto é, ser reflexão e ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo." (Id. Ib. ,40). Esta característica é colocada para se superar o "ser menos" para se construir, na práxis transformadora, o "Ser Mais", homem livre, criativo e inventivo. (Op. Cit. 35). O "ser menos" é o significante de uma natureza depredada e destruída. O "Ser Mais" é a recuperação, é a reposição da essencialidade da natureza integrada e integradora nos seus espaços naturais e construídos.

Para a concretização da metodologia acima discutida, necessitamos de métodos e técnicas, que possibilitam a operacionalização de meios e o estabelecimento de projetos-piloto e cenários ilustrativos que sejam exemplos demonstrativos dos princípios éticos definidores de práticas relacionais. Começamos indicando que a "Conferência Intergovernamental sobre a Educação Ambiental" realizada em Tbilisi enumera recomendações para que os países planejam o desenvolvimento da educação a nível nacional, local e regional, voltada para a compreensão das questões ambientais.

Na primeira recomendação, os conferencistas orientam que "...ainda que seja óbvio que os aspectos biológicos e físicos constituem a base natural do meio humano, as dimensões socioculturais e econômicas, e os valores éticos definem, por sua parte, as orientações e os instrumentos com os quais o homem poderá compreender e utilizar melhor os recursos da natureza com o objetivo de satisfazer as suas necessidades" (Dias:1994, 64).

Na recomendação de número 2 afirma a conferência de Tbilisi, "...que todas as pessoas deveriam gozar do direito à educação ambiental" (Id. Ib. ,66), situação que poderá ser implementada tanto pela educação informal quanto a formal. Para alcançar o princípio do envolvimento na compreensão do ambientalismo seguiremos as categorias de objetivos indicados:

"a) consciência: ajudar os grupos sociais e os indivíduos a adquirirem consciência do meio ambiente global e ajudar-lhes a sensibilizarem-se por essas questões;

b) conhecimento: ajudar os grupos sociais e os indivíduos a adquirirem diversidade de experiências e compreensão fundamental do meio ambiente e dos problemas anexos;

c) comportamento: ajudar os grupos sociais e os indivíduos a comprometerem-se com uma série de valores, e a sentirem interesse e preocupação pelo meio ambiente, motivando-os de tal modo que possam participar ativamente da melhoria e da proteção do meio ambiente;

d) habilidades: ajudar os grupos sociais e os indivíduos a adquirirem as habilidades necessárias para determinar e resolver os problemas ambientais;

e) participação: proporcionar aos grupos sociais e aos indivíduos a possibilidade de participarem ativamente nas tarefas que têm por objetivo resolver os problemas ambientais". (Op. Cit. ,66). (Grifos nossos).

Para tal finalidade propõe-se "para o desenvolvimento eficaz da educação ambiental [...] o pleno aproveitamento de todos os meios públicos e privados que a sociedade dispõe para a educação da população" (Dias:1994,65). Podemos indicar possibilidades do fazer da Educação Ambiental: veicular por rádios e TV mensagens para informar a população sobre o histórico, os conceitos e as finalidades da teoria do meio ambiente. Divulgar artigos em jornais locais e estaduais para esclarecer e educar a população sobre questões ambientais. Confecções de panfletos, bonés e camisetas sobre o tema ambiental. Instalação de "placas educativas" nas ruas da cidade com dizeres que despertem a consciência ambiental. (os desenhos e dizeres podem ser recolhidas a partir de concursos com educandos nas escolas). Formular e montar material didático em forma de história em quadrinhos, desenhos, conceitos e metodologias da Educação Ambiental e Meio Ambiente.

Um dos objetivos básicos do ambientalismo é a participação dos grupos sociais. Neste sentido podem-se criar cenários de discussão, elaboração e escolhas de políticas que poderão hipoteticamente estar propondo ações para a resolução de problemas de uma comunidade determinada. A problematização poderá ser virtual ou concreta; dando-se maior ênfase à segunda opção, visto que a possibilidade de politização, isto é, a visualização das problemáticas da "pólis" e a criação de cenários alternativos, torna-se mais eficaz quando, por exemplo, sendo efetuado com os alunos, interpretem e olhem para o real, conseguindo democratizar-se, ou, participar efetivamente num meio social determinado que poderá ser a escola, a rua, o bairro... Essa técnica pressupõe que o cidadão não nasce cidadão e não é democrático por natureza, mas que se educa e se faz cidadão e democrático num processo, numa convivência social e política.

Neste sentido deverão ocorrer ações que estejam voltadas para a "...formação de grupos profissionais ou sociais específicos e determinados grupos de profissionais e cientistas" (Dias;1994,70). Podemos começar por princípio com um grupo de professores (as), pois entendemos pela própria natureza da sua profissão são multiplicadores potenciais de idéias que possam disseminar os objetivos da Educação Ambiental na sociedade. Como a recomendação para a Educação Ambiental é o campo interdisciplinar e transdisciplinar, faz-se mister o preparo de um grupo especial de estudo "considerando que a grande maioria dos atuais membros do corpo docente foi diplomado durante uma época em que a temática ambiental era descuidada, portanto, sem receber informações suficientes em matéria de questões ambientais e de metodologia de EA." (Dias:1994, 74), além de todas as ações professorais serem dirigidas e executadas de forma disciplinar.

Como o campo da Educação Ambiental é extremamente novo, faz-se mister o constante e contínuo contato com grupos de pesquisadores de universidades, órgãos governamentais nacionais e internacionais que desenvolvem projetos e ações voltadas para a criação da consciência e a evolução da ciência no campo ambiental.

Sob guisa de uma conclusão, avaliamos que a Educação Ambiental precisa ser crítica, participativa, política, interdisciplinar, complexa e propositiva. Estas características são necessárias para que tenhamos um olhar objetivado para os fundamentos e as práticas da modernidade que inaugurou o conhecimento especializado e fragmentário, que estabeleceu os dualismos e as dicotomias entre sociedade e natureza. O conhecimento fragmentado desconhece as relações e as interdependências existentes nos ecossistemas naturais e construídos. A unidimensionalidade, o antropocentrismo, o etnocentrismo, o monolítico e o monólogo devem ser superados pelas proposições inerentes nos modelos que afirmam a multidimensionalidade, a multiculturalidade, a pluralidade, o político e a polissemia.

A Educação Ambiental requer a participação dos indivíduos, como forma de superação das tecnoburocracias, que são métodos de planejamento centradas em especialistas que se escondem em ambiências fechadas, por isso, autoritárias, não democráticas. A tecnoburocracia não permite a participação propositiva dos grupos sociais para pensar e expericienciar o seu meio, isto é, construir o seu presente e inventar o seu futuro.

As multidimensionalidades devem ser incorporadas nos fazeres da Educação Ambiental como forma de desconstrução do imaginário reducionista representado pelo economismo. Um modelo de desenvolvimento embasado nas dimensões ecológica, cultural, econômica, espacial e social, constitui-se em matriz instituinte de práticas superadoras inauguradas pelas estruturas de conhecimento disciplinares e fragmentárias. As diversidades social e biológica são estruturantes de fazeres e conhecimentos englobadores das complexidades inerentes nas realidades que envolvem os indivíduos nas ações empreendidas cotidianamente. Portanto, todo conhecimento e todo agir é sempre localizado e contextualizado, temporal e espacialmente.

Estas proposições quererão uma postura diferenciada da constituída pelo simplismo econômico hegemônico na contemporaneidade. A Educação Ambiental como superadora da instrumentalização do desenvolvimento e do "eixo civilizatório" atual, alicerçado na competitividade e na ideologia da produtividade, requer uma ética que construa os princípios de solidariedade entre gerações e de cooperação entre as diversas culturas. O desenvolvimento com bases endógenas, visualiza a necessária manutenção dos substratos naturais e culturais existentes, servindo-se delas para a satisfação das necessidades das gerações presentes e organizando bases para a existência das gerações futuras.

Cabe à Educação Ambiental criar projetos-piloto e cenários experenciais e demonstrativos de procedimentos de aprendizagem que tenham como base a interdisciplinariedade, as relações múltiplas, as diversidades e as pluralidades existentes nos contextos que se constituem como locais das práticas educativas.

Neste sentido é que postulamos que a Educação Ambiental é um desafio para a superação do ethos industrial e moderno para a construção de uma nova ética, que incorpore as múltiplas dimensões da realidade.

XIV - REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

BENJAMIM, César (editor). Diálogo Sobre Ecologia e Política. Rio de Janeiro: Nova Fronteira: Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ,1993.

BOURDIEU, Pierre. Razões Práticas: sobre a teoria da ação. Trad. Mariza Corrêa. Campinas/SP: Papirus,1996.

------------------------. O Poder Simbólico. Trad. Fernando Tomaz. Rio de Janeiro: Bertrand,1989.

BRÜGGER, Paula. Educação Ambiental ou adestramento ambiental? Florianópolis: Letras Contemporâneas, 1994.

Ciência & Ambiente/Universidade Federal de Santa Maria. Coordenação do Curso de Engenharia Florestal, Universidade de Ijuí - Vol. 1, n. 1 (julho, 1990). Santa Maria: Ed. UFSM; Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 1991.

DEMO, Pedro. Pesquisa: princípio científico e educativo. São Paulo: Cortez, 1986.

DIAS, Genebaldo Freire. Educação Ambiental: princípios e prática. São Paulo: Gaia, 1994.

DUARTE, Newton. A Individualidade Para-Si: contribuição a uma teoria histórico-social da formação do indivíduo. Campinas, SP: Ed. Autores Associados, 1993.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra,1983.

GUATARRI, Félix. As Três Ecologias. Trad. Maria Cristina F. Bittencourt. Campinas/SP: Papirus, 1991.

GUIMARÃES, Mauro. A Dimensão Ambiental na Educação. Campinas/SP: Papirus,1995.

HELLER, Agnes. O Cotidiano e a História. Trad. Nelson Carlos Coutinho. São Paulo: Paz e Terra, 1970.

LEIS, Héctor Ricardo. O Labirinto: ensaios sobre ambientalismo e globalização. São Paulo: Gaia; Blumenau/SC: Fundação Universidade de Blumenau, 1996.

LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da Escola Pública: A pedagogia crítico-social dos conteúdos. São Paulo: Loyola, 1990.

MANNHEIM, Karl. Ideologia e Utopia. Trad. Sérgio Magalhães Santeiro. Rio de Jaeniro: Guanabarra, 1986.

MARTINI, George (Org.). População, Meio Ambiente e Desenvolvimento: Verdades e Contradições. Campinas/SP: Ed. da Unicamp, 1993.

MCCORMICK, John. Rumo ao Paraíso: a história do movimento ambientalista. Trad. Marco Antonio Esteves da Rocha e Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Relume-Damará, 1992.

PÁDUA, José Augusto (Org.). Ecologia e Política no Brasil. Rio de Janeiro: Espaço e Tempo: IUPERJ, 1987.

RUDIO, Franz Vitor. Introdução ao Projeto de Pesquisa Científica. Petrópolis: Vozes, 1996.

SACHS, Igancy. Ecodesenvolvimento: crescer sem destruir. Trad. Eneida Araújo. São Paulo: Vértice, 1986 a.

-------------------. Espaços, Tempos e Estratégias do Desenvolvimento. Trad. Eneida Araújo. São Paulo: Vértice, 1986.

--------------------. Estratégias de Transição para o Século XXI: desenvolvimento e meio ambiente. Trad. Magda Lopes. São Paulo: Studio Nobel : Fundação do desenvolvimento administrativo, 1993.

TAUK, Sâmia Maria (Org.) Análise Ambiental: uma visão multidisciplinar. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1995.

THIOLLENT, Michel. Metodologia da Pesquisa-Ação. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1992.

THOMPSON, William Irwin (Org.). Gaia: uma teoria do conhecimento. Trad. Sílvio Cerqueira Leite. São Paulo: Gaia, 1990.

KURZ, Robert. O Colapso da Modernização: Da derrocada do socialismo de caserna à crise da economia mundial. Trad. Karen Elsabe Barbosa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.

VIEIRA, Paulo Freire. Meio Ambiente, Desenvolvimento e Planejamento. In.: Meio Ambiente, Desenvolvimento er Cidadania: desafio para as ciências sociais. São Paulo: Cortez; Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 1995.

-------------------------- e WEBER, Jacques (Orgs.). Gestão de Recursos Renováveis e Desenvolvimento: novos desafios para a pesquisa ambiental. Trad. Anne Sophie de Pontbriand-Vieira, Christilla de Lassus. São Paulo: Cortez, 1997.

--------------------------- e HOGAN, Daniel Joseph.(Orgs.). Dilemas Socioambientais e desenvolvimento Sustentável. Campinas,SP: Ed. da Unicamp, 1992.

1Professor de Sociologia no Departamento de Pedagogia na Universidade do Estado de Mato Grosso - Campus Universitário de Sinop e pesquisador no campo da Educação Ambiental.

http://www.unemat-net.br/artigos/supera.html


Desafios Locacionais para o Desenvolvimento da Educação Ambiental.

Prof. Msc. Laudemir Luiz Zart.1

A Educação Ambiental (EA) é uma temática em destaque na atualidade. Decorrente da problemática ambiental (Grüin, 1996), faz parte dos comentários e dos noticiários cotidianos dos meios de comunicação de massa e de discursos inflamados e apaixonantes de militantes defensores da ecologia. A EA entrou nas universidades e nos programas governamentais quase como um item obrigatório das discussões teóricas, metodológicas e das práticas de acadêmicos, planejadores e gestores de políticas públicas. Compreendemos como desafios locacionais, as práticas educativas que implementam ações localizadas em micro-espaços sociais e culturais, aplicando nestes os princípios, as teorias e as metodologias orientadoras da Educação Ambiental.

A difusão rápida gerou situações de confusão e de redução do conceito de Meio Ambiente e do conceito de Educação Ambiental ocorrendo um processo que Grüin (1996) denominou de "ecologização das sociedades"(15). O meio universitário predominantemente, assim como os meios difusores de massa, criaram um conhecimento que não rompe com o modelo atual de ciência que trabalha numa perspectiva cartesiana e disciplinar. Este modelo criou um reducionismo biologista e ecologista da teoria, da metodologia e por conseguinte das ações dos agentes sociais nas práticas cotidianas assim como uma redução unidimensional e estática do planejamento de políticas públicas referentes ao Meio Ambiente.

Estes equívocos foram constatados por pesquisadores do Estado do Rio de Janeiro que ao realizarem a leitura da compreensão do significado de Meio Ambiente entre estudantes de terceiro grau, professores universitários e de segundo grau, e, militantes em organizações não governamentais, constataram que estes "...percebem a EA na sua dimensão ecológica e, portanto, restrita, excluindo outros campos do conhecimento humano, como a política e a ciência social, [apresentando um] conteúdo naturalista."(Pedrini e De Paula:1997,90). No entanto precisamos avaliar que "a crise ecológica, vista como um sintoma da crise da cultura ocidental, tem engendrado uma ampla investigação a respeito dos valores que sustentam nossa cultura."(Grüin: 1996,21).

Além do reducionismo à dimensão ecológica, Grüin nos chama a atenção para a visão hegemônica construída a partir da "ética antropocêntrica." (23). O antropocentrismo valoriza como centralidade de todas as existências o homo sapiens. Este se auto-avalia e se nomeia senhor de todas as espécies vegetais e animais, fazendo destas suas fontes de sustento e de satisfação dos desejos egoísticos, enquanto EU individual e coletivo da espécie dos hominídios.

O antropocentrismo, visão de mundo fundamental para os renascentistas, tornou-se para a orientação societal e epistemológica da Educação Ambiental um entrave para a consecução de objetivos edificadores das condições de sustentabilidade da vida no planeta azul. O antropocentrismo é resultante da capacidade intelectual, imaginativa e cultural do homo sapiens transformar a natureza, incorporando instrumentos (tecnologia) para a construção do seu habitat. A questão que permanece é compreendermos se o ser humano terá sabedoria, e por isso modéstia, de se auto-avaliar e se

acentralizar?

A humanidade precisa de um novo renascimento. O "paradigma mecanicista" (Grüin: Ib., 27) petrificou o intelecto do homem as estruturas fechadas e as engrenagens que se projetam em torno de seu próprio organismo e movimento, não possibilitando a ultrapassagem do existente para um fazer criativo e inovador que possa fazer uma outra existencialidade. A qualidade deste outro difere da contemporaneidade castradora das liberdades individuais e sociais. As dicotomias criadas são dilemas que reafirmam o corpo da sociedade e dos sistemas econômicos e ideológicos consolidados. Sob esta perspectiva, não teremos a energia para desconstruir as relações e os esquemas de verdade e de poder predominantes.

A desconstrução da direcionalidade dos períodos históricos contemporâneos requer uma epistemologia e uma filosofia que se baseia em contextos locacionais determinados, quebrando os princípios universalistas e a concepção de mundo substancialista, para enquadrar os regimes compositivos das sociobiodiversidades. Esta epistemologia associada a uma sociologia do conhecimento solicitam que os homens e mulheres sejam educados para conquistar a liberdade e a criatividade tornando-se capazes de serem participativos e propositivos abandonando os mecanismos simplistas para fazer um saber e um conhecimento que introduza e pratica as complexidades construindo uma filosofia relacional, que conforme o constructo de Bourdieu (1996) abranja as "...estruturas objetivas (dos campos sociais) e as estruturas incorporadas (do habitus)"(10), ou do comportamento e das relações que os indivíduos estabelecem nas práticas sociais.

Caso não ocorra a mudança de paradigma nos procedimentos da educação ambiental, podemos categoricamente afirmar com Brügger que esta será só mais uma tentativa, não se posicionando além do "adestramento ambiental". Toda educação que é direcionada para a conquista e a construção da liberdade é uma educação política. Por isso, "educar é um ato político. Educar para quê e para quem é portanto uma pergunta cuja dimensão social a situa no cerne da chamada educação ambiental." (Brügger: 1994,76).

Sugerimos uma Educação Ambiental instituinte capaz de construir e estabelecer disposições para viabilizar os "...espaços de possíveis [isto é] o que faz com os produtores de uma época sejam ao mesmo tempo situados, datados, e relativamente autônomos em relação às determinações diretas do ambiente econômico e social." (Bourdieu: 1996,53).

Se a Educação Ambiental não for complexificada e politizada, corremos sérios riscos de promoção de equívocos reducionistas, servindo basicamente para a consolidação de sociedades hierarquizadas política, econômica e ecologicamente (pensamos aqui na distribuição dos espaços urbanos que recebem e os que não recebem infra-estrutura de saneamento básico, por exemplo). As estruturas sociais que estão construídas em pilares que representam sustentáculos das desigualdades sociais, da corrupção, da exclusão social e da promoção da violência contra a criatividade e a inventabilidade. A Educação Ambiental não pode se enclausurar nas "estruturas estruturadas", mas, em conformidade com Bourdieu (1996), instaurar "estruturas estruturantes", isto é, permanecer na campo do instituído historicamente, no entanto, proporcionar modelos teóricos e práticos superadores das condições e situações estruturadas.

Neste sentido a Educação Ambiental necessita alicerçar-se em bases críticas, isto é, orientar-se para a promoção de mudanças de atitudes de grupos sociais determinados. Não pode, ela no entanto, restringir-se à postura de busca de mudanças atitudinais de grupos sociais isolados, mas promover programas e políticas de conscientização e de ações que superem as estruturas sociais, econômicas e culturais excludentes e as ecologicamente imprudentes e desequilibradas.

Podemos transformar esta constatação em tese e afirmar que a Educação Ambiental aplicada e praticada em organizações não governamentais, por órgãos públicos, por universidades e escolas na perspectiva reducionista indicada acima não possibilitará outra prática senão a da reprodução do paradigma dominante de interpretação do valor e da relação do homem-homem e da relação homem-natureza, não chegando a "...capacitar o cidadão para uma leitura crítica da realidade e uma participação consciente no espaço social"(Pedrini e De Paula:1997,91). As ações predominantes do homem moderno com o seu meio e os recursos que este contém são caracteristicamente predatórias. A humanidade constatou este fenômeno e projetou desafios a nível global para assegurar a persistência das condições materiais e espirituais dos substratos que sustentam e edificam a vida. Concordamos com os autores acima citados quando afirmam que a Educação Ambiental se "insurge num contexto derivado do uso inadequado dos bens coletivos planetários em diferentes escalas espaço-temporais."(88).

Ao questionarmos o cartesianismo não propomos pensá-lo enquanto eficiência de inventabilidade e de orientação criteriosa para a projeção do edifício da ciência moderna. O que nos possibilita a crítica são os dualismos dicotômicos edificados a partir da ciência modernizadora que se compôs em bases procedimentais simplificadoras, que dispensam dimensões inerentes à realidade sócio-ecológica. Na afirmação de Brügger: "não existem as dicotomias homem-natureza, cultura-natureza ou natureza-história a não ser na circunscrição do pensamento cartesiano, predominante em nossas sociedades industriais."(1994:21).

Apontamos como objetivo da nossa reflexão a incorporação e a análise da "variável locacional" (Sachs:1993,41). Reconhece este mesmo autor, que a variável locacional fora deixada como uma dimensão secundária nos processos de planejamento das ações dos grupos sociais na busca de soluções para os problemas da humanidade. Orientados pela metodologia holista os homens e as mulheres preocupadas com as questões sócio-ambientais tenderam a verificar com maior intencionalidade os problemas que atingem a humanidade em termos genéricos, visto que "a degradação ambiental não obedece às fronteiras políticas."(Pedrini:1997,23) Esta situação não significa, sob a nossa interpretação um equívoco metodológico, visto que os princípios e as avaliações realizadas por organizações como a ONU, são fundamentais para a orientação do conjunto daqueles que se dedicam às questões ambientais. O que precisamos avaliar é como muitas informações são recebidas e assimiladas ao nível do local e qual a conotação que o conceito de Meio Ambiente recebe em uma localidade determinada.

Indicamos acima que possuímos desafios. Aceitamos a afirmação de Sousa Santos que visualizou que estes "...nascem sempre de perplexidades produtivas."(1997,17). Assim podemos afirmar que a humanidade ficou perplexa frente à capacidade de destruição que instalou. O modelo econômico e a racionalidade que o acompanhou engenhou comportamentos que buscam, sob cálculos e projeções feitas para a eficiência e a resposta a curto prazo, o lucro rápido e fácil. A ideologia subjacente ao modelo de produção moderno desprezou a incorporação das múltiplas dimensões que compõem a realidade. A abstração dos modelos construídos ficaram distantes do real, não absorvendo a complexidade inerente aos sistemas naturais e sócio-culturais.

As perplexidades da humanidade tornaram-se produtivas quando esta teve a capacidade de inventariar as práticas destrutivas inventadas pelos homens em seus tempos e espaços históricos e simbólicos. Avaliar-se e redefinir os rumos da humanidade são os desafios lançados nestas últimas décadas. A produtividade das perplexidades se dão tanto no nível teórico quanto no prático. Não podemos separar as duas dimensões, mas percebê-las integradas e integradoras. As teorias proporcionam a capacidade de fazer ver e avaliar o passado, o presente e olhar prospectivamente para o futuro.

Se somos convidados a pensar globalmente e agir localmente, avaliamos que temos muito o que fazer. O desafio é sermos produtivos no local onde residimos. A visão da residência é relativa. Ela está em conformidade com as práticas dos indivíduos. O local de um planejador internacional poderá ser o próprio planeta, enquanto o limite de um "trabalhador braçal" poderá ser a territorialidade da sua cidade. Independente das diversas possibilidades precisamos refletir como os homens devem pensar e agir no seu local.

Para chegar a esta questão abordaremos anteriormente algumas das situações-problema que englobam a discussão das questões ambientais. Destacamos os equívocos que são gerados em torno da conceituação de Meio Ambiente. Assim como a pesquisa relatada por Pedrini (1997), constatamos em investigações de campo realizadas na cidade de Sinop no Estado de Mato Grosso, através do Projeto de Educação Ambiental ligado ao Departamento de Pedagogia da Universidade do Estado de Mato Grosso - Campus Universitário de Sinop, que a conotação dominante do conceito de Meio Ambiente entre estudantes de primeiro, segundo e terceiro graus, de professores (as) que atuam nos níveis básico e secundário, além de profissionais liberais como médicos, dentistas, advogados e engenheiros, o mesmo equívoco reducionista e com conteúdo naturalista. Este reducionismo se manifesta pela visão predominantemente fragmentária, com estatuto disciplinar e estático.

A investigação de campo foi realizada em escolas de primeiro e segundo graus públicas e privadas, com estudantes de terceiro grau dos cursos de licenciaturas plenas de matemática, letras e pedagogia na Unemat - Campus Universitário de Sinop, professores (as) de primeiro e segundo graus atuantes nas redes públicas estadual e municipal na Região Geo-Educacional de Sinop, além de profissionais liberais como advogados, médicos, engenheiros e dentistas. Aplicamos entrevistas semi-abertas através das quais buscamos a leitura da percepção e da proposição para o meio ambiente.

Os resultados que foram alcançados chegaram a confirmar a nossa hipótese inicial, qual seja, a existência de uma concepção reducionista e equivocada do conceito de meio ambiente. Constatamos uma predominância da percepção de que meio ambiente é sinônimo do conjunto de elementos biofísicos ou naturais: animais, vegetais, minerais, água, ar, terra e florestas. Esta concepção variou entre 35,43% entre estudantes de 5º - 8º séries; 41,71% entre estudantes de segundo grau; 44,44% entre professores (as); 46,77% entre universitários e 31,49% entre profissionais liberais. A perspectiva antropocêntrica acompanha a visão biofísica. Entre os estudantes de 5º - 8º séries representa 16,74% das leituras; 39,20% entre os educandos de segundo grau, 33,33% para professores (as); 38,71% para universitários e 40,75% para os profissionais liberais.

Sob o primeiro olhar, poderíamos afirmar que as perspectivas biofísicas antropocêntricas são visões excludentes. No entanto as leituras antropocêntricas trazem afirmações tais como: "o meio onde vivemos e devemos preservar, para que possamos continuar vivendo", "sem ele é muito difícil de viver", "é a nossa sobrevivência", "é o próprio sustento da humanidade". Estas ao contrário do que demonstrar duas posturas excludentes são dois pólos complementares. O antropocentrismo percebe a natureza enquanto substrato que deve ser preservado e conservado com a função de manutenção de vida do ser humano. A complementaridade entre os dois pólos não se dá, no entanto, de forma relacional, mas apresenta-se linearmente, através da qual o homem pode dominar a natureza.

O pensamento antropocêntrico é uma construção ideológica que pressupõe a superioridade do ser humano sobre as demais espécies. Por ter a capacidade intelectual e a propriedade do juízo e da racionalidade, o homem não somente se diferencia da natureza, mas se coloca acima dela como senhor que a explora. Somente no instante em que está em alerta frente as possibilidades de destruição total do substrato biofísico, é que o homem se põe em situações e posturas reflexivas de perplexidades e busca construir soluções alternativas.

Ao mesmo tempo em que ocorre a preocupação com a destruição dos substratos naturais que impossibilitariam a existência humana, constatamos nas nossas investigações uma responsabilização das atitudes dos homens frente ao processo predatório. Classificamos esta percepção com a categoria "ação antrópica". Esta aparece com expressões que denominam e demonstram as ações destrutivas do homem sobre o meio natural, quanto: "queimadas, desmatamentos, poluição, destruição da camada de ozônio." Tem-se uma constatação caótica: "a humanidade agride a natureza tanto, de modo a chegar a índices alarmantes", observando que os "homens não respeitam o meio ambiente". A concepção que o meio ambiente é modificado pela ação direta do homem aparece num percentual de 15,87% entre os estudantes de 5º - 8º séries; 11,56% entre secundaristas; 9,95% entre os universitários; 11,11% entre os profissionais liberais e 14,52% entre os (as) professores (as) que atuam nos primeiro e segundo graus.

As perspectivas biofísicas, antropocêntricas e antrópica são percebidas de forma isolada, portanto não relacional. Avaliamos que este conhecimento é resultante da estrutura disciplinar e fragmentária próprio da estrutura escolar e das ciências. Legamos para a vida cotidiana e para as representações que criamos a visão de mundo e o conhecimento que fora constituída pela racionalidade da modernidade. Como superá-la?

No campo das proposições, constatamos predominantemente a preocupação com a conscientização dos homens em relação ao meio ambiente. Sugerimos no nosso questionário que os entrevistados indicassem o que deveria ser feito no meio ambiente. O processo de conscientização através de campanhas publicitárias via meios de comunicação e procedimentos instrutivos e educativos via escolas e implantação de espaços e ações públicas como limpeza e manutenção de praças, instalação de lixeiras em lugares públicos, reciclagem de lixo, controle de desmatamento e avaliação dos impactos ambientais. Estas proposições alcançaram índices de 47,59% entre os estudantes de segundo grau; 30,61% entre educadores (as); 29,39% entre universitários e 29,10% entre os profissionais liberais.

Acompanhando o processo de conscientização para a melhoria da qualidade de vida, destacam-se ações como preservação, reflorestamento (preocupação que provém das próprias condições de exploração dos recursos naturais pela indústria de extração vegetal); espaço urbano como asfaltamento, instalação de saneamento básico, cinturão verde, não queima - mas aproveitar os resíduos da madeira, limpeza dos espaços públicos e exigência de conservação dos espaços privados.

Circunstanciado por estas proposições constatamos, em percentuais menores a indicação de maior rigidez na aplicação da lei, associando esta à coerção e à punição. Apareceram ainda sugestões quanto a criação de parques ecológicos, de reservas florestais, pesquisas científicas para conhecimento das variedades e propriedades da flora e da fauna, controle da erosão e o desenvolvimento da agricultura sustentável.

A preocupação e as proposições em relação ao meio ambiente giraram em torno da busca pela preservação das condições para salvaguardar a vida humana. Apesar disto, o homem não aparece como instância constituinte do meio ambiente. Aparece a exploração da natureza, no entanto, a exploração da força de trabalho, a alienação, o empobrecimento, o analfabetismo, os homens e mulheres sem teto, sem saúde, sem educação e sem terra não aparecem como fenômenos integrados ao conjunto das multidimensões que compõe o meio ambiente.

Os reducionismos são fenômenos constatados tanto nos ambientes universitários e escolares quanto nos espaços sociais e profissionais. Apesar desta realidade permanece prospectivamente a possibilidade de a Educação Ambiental ser uma metodologia de "...reconstrução multifacetada não cartesiana do saber humano. Isto é, uma EA considerada como saber construído socialmente e caracteristicamente multidisciplinar na estrutura, interdisciplinar na linguagem e transdisciplinar na ação não [podendo] ser área profissional específica de nenhuma especialidade do conhecimento humano."(Pedrini: 1997,15).

As atitudes e os procedimentos interdisciplinares são desafiadoras para a Educação Ambiental porque objetiva a "...transgressão aos paradigmas rígidos da ciência escolar atual, na forma como vem se configurando, disciplinarmente [para alcançar] a complexidade dos fenômenos envolvidos nas ocorrências da sala de aula."(Fazenda:1994,63). Consideramos que na relação entre posturas multi, trans e interdisciplinares, a última constitua uma metodologia mais profunda, porque não somente pensa a colocação estrutural das ciências, mas provoca uma reflexão e uma ação que percebe os movimentos e as dinâmicas relacionais entre as partes e o todo.

Ao perseguir a proposição da transversalidade, avaliamos que o Ministério da Educação e do Desporto ao editar os Parâmetros Curriculares Nacionais, lançou para os Educadores Ambientais uma problemática instigante. Ao considerar que a Educação Ambiental não poderia se tornar uma nova disciplina avançou na direção de fazer constituir meios educativos e a construção de conteúdos transdisciplinares. Consideramos dois fatores que precisam ser avaliados na proposta. Uma primeira avaliação nos demonstra que a política adotada pelo ministério não rompe com a velha estrutura disciplinar, no entanto a reedita e reafirma. Por outro, lança um desafio para os (as) educadores (as) desenvolver uma temática em qualquer das disciplinas: na matemática, na linguagem, nas ciências sociais, nas ciências naturais. O desafio lançado aos sujeitos cognocentes, transmissores e produtores de conhecimento se tornem difusores e popularizadores de um conhecimento não popularizado ou muitas vezes difundido de forma equivocada. A exigência vai além, a justificativa e o referencial teórico inerente no material editado pelo ministério requer a mudança de paradigma interpretativo. Verificando que a percepção de Meio Ambiente presente entre educadores e na população brasileira, pesquisa citada em documento da Coordenação da Educação Ambiental do MEC, demonstra que a maioria da população investigada entre brasileiros responderam ao questionamento sobre "Meio Ambiente", que este é sinônimo de elementos naturais como a água, o ar, as matas e os animais. Frente a esta realidade, não estaremos simplesmente inventando mais um procedimento para reafirmar as atitudes, as representações e as estruturas existentes? Qual será o compromisso das universidades, das escolas, da sociedade, dos órgãos públicos para a promoção de um saber-fazer distinto e distintivo?

A transversalidade não é uma metodologia que garanta o desenvolvimento de uma linguagem que seja distintiva das construções mecanicistas dominantes. Queremos ser otimistas e apostar na possibilidade de políticas públicas e institucionais que rompam com o modelo epistemológico e a filosofia praticada cotidianamente. Como e porque romper?

Esta questão é inquietante. O porquê deve ser explicitado pelos métodos predatórios adotados pelos homens nas relações que estabelecem entre si e com a natureza. A fome, a doença, a pobreza, a exclusão social, o analfabetismo, as guerras, as ditaduras políticas, os caciquismos e os coronelismos políticos locais, as manobras ideológicas que ocultam a realidade criando ilhas fantasmagóricas, a corrupção, a falência da saúde pública, a qualidade desprezável dos métodos e dos conteúdos aplicados e ministrados nas escolas, a violência sexual, étnica e social; somados e associados à extinção de espécies, ao desmatamento desenfreado e descontrolado, à poluição do ar, dos rios, ao uso indiscriminado de agrotóxicos, a erosão e a perda de solos férteis, o assoreamento dos rios, lagos e nascentes, a emissão de gazes nocivos, a depredação generalizada da bio e sociodiversidade são eventos que elucidam os acontecimentos destruidores das condições materiais e imateriais, culturais e naturais de existência.

Como romper com o atual modelo? Iniciativas como os eventos patronizados pela ONU são necessários, porém não suficientes. Se as avaliações, os princípios lançados não chegarem até o chão do mundo, o risco é estes eventos não passarem de grandes festas e confraternizações de alguns "iluminados" financiados pela humanidade, para em seu nome avaliar e projetar o presente e o futuro.

A coragem está em avaliar, sistematizar e analisar, para criar e inventar modelos de ação para a inserção ativa e participativa nas dimensões locais. Não podemos afirmar que o global não será fonte de ação. A globalidade além de constituir um local de atuação, representa a práxis da avaliação, a troca e a absorção de experiências.

No entanto, queremos trabalhar o ideário que é tornado cenário para a aprendizagem no local (rua, bairro, cidade) no qual vivem, trabalham, sonham e se relacionam a maior parte dos grupos sociais. O que é uma rua senão uma paisagem cheia de símbolos que foram constituídos e são estruturantes de perspectivas de mundo, de atitudes, enfim, do habitus dos agentes sociais? Podemos avaliar que um bairro, no qual não ocorre nenhuma organização em prol da possibilidade do surgimento de comportamentos volitivos, da linguagem, de conhecimentos e de experiências, constituídos a partir da complexidade das funções mentais humanas superiores, em consonância com o referencial sócio-histórico construído por Vygotski (1994), não se criarão as condições de conscientização que promovam a mudança.

A propaganda é um instrumento metodológico de sensibilização das populações, no entanto isolada não desperta os grupos humanos do sono profundo da ignorância em relação a problemas que os afligem. Ela é um passo importante, no entanto, exige a complementação com políticas públicas que concretizem o enunciado e o anunciado. Esta concretização se dá através da construção de cenários que tornam sensíveis os enunciados.

Compreendemos por cenário, a paisagem que contém os atores, as luzes, o enredo, os movimentos, as inclinações que dizem, que demonstram, que visualizam e que expressam um modus operandi, um saber-fazer instituído e instituinte.

Como poderá ser estruturado o cenário? Como os atores vão participar? Queremos explicitar que os cenários poderão ser diversos na sua forma, cor, disposição e constituição. Para desenvolver uma linguagem dialogal entre educandos da escola básica podemos imaginar textos que, intertextuais, expressam a contextualidade. Se o cenário é um texto, este deverá ser expressivo para configurar a liberdade criativa e imaginativa. O texto deve ser desafiador, contestador, provocativo, exigente (Freire e Shor: 1986). O cenário não precisa ser restringido ao texto. A contextualidade pode ser transposta para a representação cênica, na qual se manifestam os movimentos da leveza ou da opressão e da prisão da nossa corporalidade. Os corpos que não são livres não se expressam com leveza e com liberdade, mas procuram um casulo para se ocultar, por isso não participam, não protestam, não contestam e por conseguinte não propõem. Neste sentido a teatrologia é uma manifestação sensibilizadora das condições existenciais de grupos sociais, despertando-os para a expressividade. Em consonância com Habermas (1989) podemos indicar a constituição de ações comunicativas intersubjetivas que manifestam o mundo da vida dos sujeitos construtores.

Ainda ao imaginarmos concretudes, podemos apontar a implantação de parques ecológicos. Estas demonstrações devem sempre serem compreendidas como atividades meio para a Educação Ambiental. Desta forma, um parque ecológico, torna-se um cenário para a visualização e o conhecimento das variedades da flora e da fauna. O parque ecológico poderá ser o ir além de uma aula discursiva sobre a importância da preservação e conservação das espécies vegetais e animais, e, tornar-se uma objetivação do discurso sobre as espécies, para se constituir um discurso das espécies, afastando o medo de animais tão cultivado em crianças, resultante na maior das vezes do preconceito, que provém da falta de conhecimento.

Podemos ainda demonstrar as possibilidade diversas da Educação Ambiental na variável locacional e experimental, indicando a institucionalização de políticas públicas para a coleta seletiva do lixo. Pensemos uma cidade que tem como paisagem o recolhimento irregular do lixo. Os indivíduos integrados a paisagem deste espaço urbano não terão nenhuma motivação constituída para representar na significação do lixo de forma a não ser considerá-lo homogêneo na sua constituição, assemelhando os rejeitos orgânicos aos inorgânicos. Por outro, os cidadãos constituintes de uma determinada pólis poderão modificar o cenário da apresentação e da composição do enredo da peça que representa o lixo. O cenário não passará de uma ilustração confusa e desordenada para a organização conscientizadora do que é lixo e quando deixa de sê-lo, partindo para atitudes que incorporem a reflexão sobre os rejeitos e por conseguinte sobre problemáticas sócio-ambientais, ligados aos recursos, à energia, à distribuição e consumo de bens materiais e imateriais, ao processo produtivo. Tem-se a possibilidade de questionamento da queima dos lixões que produzem gazes poluentes e passa-se a ações de recolhimento discriminado e a reutilização em forma de recurso aquilo que era resíduo.

Queremos ainda exemplificar como criação de cenário importante para a Educação Ambiental a implementação do cinturão verde, que representa a viabilização de propriedades familiares e o abastecimento dos mercados com produtos horti-fruti-granjeiros. O cinturão verde não poderá ser planejado somente em termos de viabilidade econômica para o mercado. Tem a necessidade de incorporar no modelo, por extensão, a saúde pública. Ora pensar o cinturão verde como saúde pública é desenvolver uma agricultura alternativa denominada como regenerativa, biológica, orgânica, ecológica; compreendendo-se por esta "...fundamentalmente [...] um tipo de agricultura que reduz, por meio de novas técnicas agrícolas, o uso de insumos químicos, mas que tem como objetivo central a sustentabilidade dos agroecossistemas [tendo como objetivos] promover a saúde de agricultores e consumidores; manter a estabilidade do meio ambiente, mediante incorporação dos processos naturais, como os ciclos de nutrientes, a fixação de nitrogênio, o controle de pragas pelos seus predadores naturais; assegurar os lucros dos agricultores a longo prazo; e produzir para responder às necessidades atuais da sociedade, considerando-se também as gerações futuras."(Guivant: 1995, 103-104).

Estas hipóteses de práticas são elucidações de planejamentos e concretizações de políticas de Educação Ambiental que a localidade pode aplicar, criando cenários conscientizadores, que possibilitam a metamorfose de atitudes e representações predatórias e reducionistas em ações e conhecimentos que corporificam a conservação das diversidades biológicas sócio-culturais atingindo modelos que simbolizam a apreensão das complexidades das relações multi-dimensionais que constituem o meio ambiente: o biológico, o sócio-cultural, o ecológico, o educacional, o político, o econômico (Vieira: 1995).

Os modelos exemplicados terão funcionalidade quando aplicados técnicas e metodologias de planejamentos participativos. Estes encaminhamentos exigem a superação do modelo tecno-burocrático que prioriza as racionalidades técnicas de preenchimento de processos, constituindo-se em atitudes de planejamentos fechados e centrados em técnicos especializados. O planejamento participativo é uma metodologia de desprendimento, de tolerância, de busca, de compreensão, de construção coletivizada, que gesta, sistematiza, viabiliza, orienta as condições de empreendimento pró-ativo das construções socioambientais. Para a viabilidade da participação é preciso "...levar em conta a arquitetura de um sistema de planejamento que seja capaz de tornar o envolvimento popular não uma série de eventos pontuais - a exemplo de audiências públicas - e nem um conjunto de ocorrências aleatórias, mas um processo contínuo e estrategicamente orientado." (Vieira: 1995, 83). A participação deve levar ao que Demo (1995) indica como "...competência humana de fazer-se sujeito, para fazer história própria e coletivamente organizada"(01). Esta, condição necessária para a superação ao que o autor denomina de "pobreza política", a fim de construir uma sociedade democrática e emancipatória.

Consideramos assim que a Educação ambiental é uma atitude que incorpora no seu desenvolvimento múltiplas dimensões. A aplicação e o desenvolvimento locacional exige em primeiro lugar a superação da perspectiva reducionista e mecanicista de meio ambiente e educação ambiental. Esta construção primordial levará a outros procedimentos como a constituição de atividades meio através das quais educandos e educadores, através de ações participativas despertam a curiosidade, o questionamento e a busca construtiva do conhecimento através da pesquisa, constituindo-se em "princípio científico e educativo" conforme Demo (1996) propõe.

Compreendida em sentido complexo, a Educação Ambiental envolve atividades como passeios ecológicos, porém não pode ser reduzida a estas. Devemos levar em consideração que esta técnica supõe procedimentos metodológicos como a observação de campo das ações antrópicas sobre a natureza, a ocupação do espaço pelo homem, as espécies de vegetais e animais existentes. A observação de campo sempre vem precedida de um preparo que envolve o estabelecimento de objetivos, de hipóteses e de técnicas de registro. Encaminhada reflexivamente, a Educação Ambiental pode ser desenvolvida em qualquer ambiente: escola, associação de bairro, igreja, empresa, residência.

As escolas, enquanto Educação Ambiental formal é um espaço simbólico e organizacional privilegiado para o seu desenvolvimento. Não se constituindo em uma disciplina especializada, perpassa a reflexão por todas as organizações disciplinares estabelecidas. Neste sentido "a educação ambiental como perspectiva educativa, pode estar presente em todas as disciplinas, quando analisa temas que permitem enfocar as relações entre a humanidade e o meio natural, e as relações sociais, sem deixar de lado as suas especificidades."(Reigota:1996,25).

Reigota ainda desenvolve uma reflexão sobre as dificuldades que muitas professoras e professores passam quando se propõe em oferecer uma atividade educativa voltada ao meio ambiente. Enfrentam dificuldades econômicas para promover viagens para lugares distantes e exóticos. É evidente que estas atitudes são orientadas por uma concepção de Meio Ambiente. Esta perspectiva despreza o espaço simbólico e físico próximo para querer conhecer o distante. Não se percebem o jardim da escola, a sala de aula, a rua ao lado, o bairro como ambiências que contém significados que expressam a linguagem, a cultura e a visão de mundo dos grupos sociais residentes nestes espaços determinados.

Aplicado desta forma, a Educação Ambiental solicita atitudes e procedimentos criativos e dialógicos. "A abordagem dialógica é muita séria, muito exigente, muito rigorosa, e implica numa busca permanente de rigor." O rigor está associado à liberdade. A Educação Ambiental necessita ser rigorosa para cumprir com o compromisso histórico de questionar a ciência moderna, de construir modelos epistemológicos e societários que ultrapassem os limites mecanicistas, reducionistas e excludentes dos paradigmas científicos e das hierarquias das estruturas sociais dominantes.

Neste sentido a Educação Ambiental deve ser compreendida e praticada como pesquisa que se volta para a ação e a participação ativa e criativa dos grupos sociais implicados. Estas características distinguem a pesquisa-ação como uma metodologia "voltada para a participação direta em um processo de transformação social, [...] é feito aqui através da análise de algo vivido. Não é, no entanto, apenas um estudo do passado, mas também do fluir do presente na direção de um projeto futuro."(Vasconcellos: 1997,260).

Na pesquisa-ação "...a participação e o diálogo sugerem uma troca de saberes, em que se dará tanta importância ao conhecimento comum ao lado do conhecimento científico, que aparecerá uma forte crítica aos princípios da racionalidade técnica."(Id. Ib., 263).

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA.

 

BOURDIEU, Pierre. Razões Práticas: sobre a teoria da ação. Trad. Mariza Corrêa. Campinas/SP: Papirus,1996.

BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais:meio ambiente, saúde. Brasília,1997.

BRÜGGER, Paula. Educação Ambiental ou adestramento ambiental? Florianópolis: Letras Contemporâneas, 1994.

DEMO, Pedro. Cidadania Tutelada e Cidadania Assistida. Campinas/SP: Cortez/Autores Associados,1995.

------------------- Pesquisa: princípio científico e educativo. São Paulo: Cortez, 1986.

DIAS, Genebaldo Freire. Educação Ambiental: princípios e prática. São Paulo: Gaia, 1994.

FAZENDA, Ivani C. Arantes. Interdisciplinariedade: história, teoria e pesquisa. Campinas/SP: Papirus,1994.

FREIRE, Paulo e Shor Ira. Medo e Ousadia: o cotidiano do professor. Trad. Adriana Lopes. Rio de Janeiro: Paz e Terra,1986.

GUIMARÃES, Mauro. A Dimensão Ambiental na Educação. Campinas/SP: Papirus,1995.

GUIVANT, Julia Silvia. A Agricultura Sustentável na Perspectiva das Ciências Sociais. In.: Meio Ambiente, Desenvolvimento e Cidadania: desafio para as ciências sociais. São Paulo: Cortez; Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 1995.

MÓRAN, Emílio F. A Ecologia Humana das Populações da Amazônia. Petrópolis/RJ: Vozes,1997.

PEDRINI, Alexandre de Gusmão (org.). Educação Ambiental: reflexões práticas contemporâneas. Petrópolis/RJ: Vozes,1997.

--------------------------------------------e De Paula, Joel Campos. Educação Ambiental: críticas e propostas. In.: PEDRINI, Alexandre de Gusmão (org.). Educação Ambiental: reflexões práticas contemporâneas. Petrópolis/RJ: Vozes,1997.

REIGOTA, Marcos. O Que é Educação Ambiental. São Paulo: Brasiliense, 1996.

SACHS, Ignacy. Estratégias de Transição para o Século XXI: desenvolvimento e meio ambiente. Trad. Magda Lopes. São Paulo: Studio Nobel : Fundação do desenvolvimento administrativo, 1993.

SCHWARZ, Walter e Dorothy. Ecologia: alternativa para o futuro. Trad. Maria Inês Rolim. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela Mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São Paulo: Cortez,1997.

THIOLLENT, Michel. Metodologia da Pesquisa-Ação. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1992.

VIEIRA, Paulo Freire. Meio Ambiente, Desenvolvimento e Planejamento. In.: Meio Ambiente, Desenvolvimento e Cidadania: desafio para as ciências sociais. São Paulo: Cortez; Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 1995.

VASCONCELLOS, Hedy Silva Ramos de. A Pesquisa-Ação em Projetos de Educação Ambiental. In.: PEDRINI, Alexandre de Gusmão (org.). Educação Ambiental: reflexões práticas contemporâneas. Petrópolis/RJ: Vozes,1997.

VYGOTSKY, L. S. A Formação Social da Mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. Trad. José Cipolla Neto, Luis Silveira Menna Barreto, Solange Castro Afeche. São Paulo: Martins Fontes, 1994.

1Prof. Assistente Msc. Laudemir Luiz Zart, Dpto de Pedagogia - Unemat - Campus Universitário de Sinop. Projeto de Educação Ambiental. E-mail: educambi@unemat-net.br

http://www.unemat-net.br/artigos/desafios.html


Mensagens enviadas até o dia: 03.12.2000

Projeto Apoema - Educação Ambiental

www.apoema.com.br